Entende-se por multiculturalismo tanto os estudos acadêmicos quanto as políticas institucionais que se desenvolvem em torno das questões trazidas pela emergência das sociedades multiculturais. Uma sociedade multicultural é aquela que, em um mesmo território, abriga povos de origens culturais distintas entre si. As relações entre esses grupos podem ser aceitação e tolerância ou de conflito e rejeição. Isso vai depender da história da sociedade em questão, das políticas públicas propostas pelo Estado e, principalmente, do modo específico como a cultura dominante do território é imposta ou se impõem para todas as outras. A convivência entre culturas diferentes não é uma questão nova, mas que se se intensificou nos últimos anos devido a acontecimentos marcantes.
Não é possível entender o multiculturalismo fora do contexto do fenômeno da globalização. O desenvolvimento acelerado dos meios de transporte e das tecnologias de comunicação aproximaram diferentes regiões do mundo, criando redes industriais e financeiras complexas e uma economia multinacional, interdependente e insubmissa às fronteiras nacionais. Com o fim da Guerra Fria, os Estados Unidos passam a hegemonizar culturalmente todo o planeta. Seus produtos, filmes, músicas e formas de ver as coisas se espalham globalmente gerando o que se chama de “americanização” do mundo. Frente a esse fenômeno de hegemonização dos padrões culturais globais, as culturas tradicionais se fortaleceram, reagindo contra a massificação dos modos de ser. Por outro lado, apesar da massificação, vemos que essas comunidades culturais locais são capazes de se apropriar de partes da cultura americana, transformando-as em uma algo novo e diferente do original. No Brasil, o funk e rap são um exemplo claro dessa possibilidade.
Outros processos importantes que influenciam no surgimento das sociedades multiculturais, são as lutas pela independência que ocorrem nas colônias europeias da segunda metade do século XX, especialmente na África e na Ásia. O cenário que se configura após a colonização gera um processo de resgate das culturas tradicionais locais e, ao mesmo tempo, pela ligação histórica, desencadeia um movimento migratório para os países colonizadores. Também os conflitos de ordem étnica, religiosa e política, além das deficiências econômicas, são fatores que aumentam o fluxo migratório. Incentivado por tudo isso e pelo próprio cenário criado pela globalização, esse movimento migratório transforma de modo profundo as nações que receberam os imigrantes, colocando em cheque a capacidade dos estados modernos de gerirem sua nova configuração multicultural.
Alguns países democráticos têm buscado promover a aceitação e incorporação de culturas diferentes em seus territórios, valorizando a possibilidade de se constituírem enquanto nações pluriétnicas. No entanto, em outros países, a negação de direitos sociais e a perseguição de minorias culturais são práticas oficiais. Muitas vezes, ainda que exista uma política multiculturalista oficial, a perseguição é praticada por pessoas comuns, inflamadas por um sentimento de nacionalismo e rejeição ao outro. Os ataques violentos organizados por civis aos abrigos de refugiados de origem árabe na Alemanha são um exemplo disso. O multiculturalismo emerge a partir das reivindicações de minorias étnicas que sofrem de opressão histórica em seus territórios, como os negros e as populações indígenas por todo continente americano, incluindo o Brasil. O debate em torno desse tema é muito importante e traz à tona a forma como lidamos, enquanto sociedade, com as diferenças étnicas, culturais e religiosas que nos cercam.
Bibliografia:
ZORZI, José Augusto. Estudos culturais e multiculturalismo: uma perspectiva das relações entre campos de estudo em Stuart Hall. Trabalho de conclusão de curso para obtenção de Licenciatura em História pela UFRG, 2012
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/sociologia/multiculturalismo/