O brinquedo está presente desde a mais remota Antiguidade. “Muitas brincadeiras modernas remontam ao tempo dos egípcios, como pular carniça, puxar carrinho e cabo-de-guerra.” (GUY, 2005, p.28). Bonecas e soldadinhos estão nos registros da Grécia e Roma antiga. Da mesma forma que os vikings, os gregos possuíam forte interesse pelos jogos de tabuleiro. No Brasil, a roda infantil é a primeira manifestação recreativa incorporada pelas crianças. As inúmeras cantigas de roda preservam o legado sócio-cultural, atribuído aos nossos antepassados portugueses e africanos.
Observamos que até o século XIX, o ato de brincar foi considerado um passatempo sem qualquer importância, sendo reservado para as horas de folga ou lazer. Nas famílias patriarcais, os modelos rígidos e normativos não colaboravam na criação de espaços que favorecessem a interação de diferentes gerações. A interrupção precoce das atividades lúdicas, devido às ordens sociais e morais, visava à preparação dos descendentes para a idade adulta, onde o homem e a mulher assumiam papéis bem definidos.
Atualmente, a brincadeira é vista como uma prática favorável na criação do elo inicial, no que diz respeito ao relacionamento e comunicação dos pais com os filhos, ou vice-versa. Estudiosos confirmaram a importância do jogo, esporte, história, música e dança no desenvolvimento humano. O estímulo saudável propicia a abertura de “janelas” permitindo o estabelecimento de conexões cerebrais nos primeiros anos de vida da criança. “Aumentando suas sinapses, aumentam seus recursos de informações, tornando-a mais inteligente, criativa e feliz, pois não podemos esquecer um ingrediente fundamental à plasticidade das células nervosas, que é a emoção.” (SOUZA et al., 2010, p.82).
No entanto, para a significativa evolução do potencial interno do indivíduo, foi constatada: a importância de um ambiente confortável para as brincadeiras; a atribuição do tempo em função da quantidade e qualidade; a predisposição da criança para as atividades lúdicas, respeitando a evolução biológica da mesma; a atenção, o afeto e o estímulo proporcionados pelos pais e pessoas do convívio cotidiano. Conjunto este, capaz de contribuir para uma aprendizagem prazerosa e motivadora, quando evitadas as pressões e os estímulos exagerados.
Diante das inúmeras possibilidades, os educadores contam com os jogos e as brincadeiras como um instrumento eficaz no ensino.
“Entre eles, destacam-se o maturacional, no respeito às fases de desenvolvimento da criança; o conceitual, na compreensão das diferenças culturais entre jogo e esporte; o do regionalismo, no processo de valorização e re-significação da cultura lúdica; o da individualidade, nos respeito a cada um no processo de aprendizagem; o da complexidade, ao se buscar as várias dimensões de desenvolvimento; o da seriedade, ao se pensar nos valores dessa atividade à criança; o da inclusão, ao inserir todos na atividade; o da ludicidade, ao respeitar o interesse e o prazer da criança; e o da coletividade, ao propor o espírito de cooperação do fazer junto.” (SOUZA et al., 2010, p.96).
O professor, também chamado de mediador, ao inserir a brincadeira em sala de aula enriquece o próprio conhecimento, além de obter um novo olhar sobre o aluno. As crianças se expressam com superior liberdade e criatividade, aumentando a predisposição para receber o conteúdo. Por outro lado, o profissional ao conhecer o grupo de perto, pode observar e repensar as atividades conforme o desenvolvimento do trabalho, obtendo subsídios para concepção de novas dinâmicas. “Mais uma vez está comprovado que a aprendizagem do aluno tem muito mais proveito quando ela acontece de forma lúdica, ao invés de estar somente repassando e cobrando (...) o resultado quantitativo e não o qualitativo.” (SOUZA et al., 2010, p.235).
Não podemos limitar as práticas que chamamos de lúdicas. O livro, por exemplo, deve ser visto como um brinquedo; uma ferramenta para que a brincadeira aconteça. O momento da leitura deve ser prazeroso e aberto à reflexão e expressão da criança. Portanto, o quanto antes inserirmos a contação de histórias no cotidiano dos pequenos, melhor será a recepção futura. E, dependendo de como é conduzido o momento da contação – o qual deve gerar satisfação e envolvimento –, a narrativa pode evoluir em uma brincadeira onde os próprios participantes ajudam no seu desenrolar. “A leitura é considerada por Kleiman (1997) como uma espécie de jogo de adivinhações, em que um sentido, ainda velado ao leitor, deve ser encontrado.” (SOUZA et al., 2010, p.222).
Os livros devem ir além da ideia de um objeto para a instrução. Devem ser manipulados e aguçar os sentidos das crianças. As obras infantis não podem estar restritas simplesmente às estantes, mas encontrar-se acessíveis entre os brinquedos. Os primeiros livros são resistentes e devem sim ser armazenados nas caixas onde se localizam as bonecas e os carrinhos. É preciso que os pais ofereçam publicações dentro da faixa etária correta com a consciência de que uma ou outra obra será destruída, dependendo das circunstâncias – e, como qualquer outro brinquedo. Nestas ocasiões é importante educar os pequenos no sentido de serem mais responsáveis e cuidadosos com os seus pertences.
Curiosamente, a primeira obra infantil ocidental que se tem registro, datada de 1744, já exibia nas suas páginas algumas brincadeiras comuns para a época. Segundo o Blog da L&PM Editores, o título em português é “Um lindo livrinho de bolso: destinado para a instrução e diversão do pequeno mestre Tommy e da linda senhorita Polly.” A publicação além de reunir ilustrações traz o texto em verso, onde o autor brinca com as palavras. “O livro é repleto de rimas simples e de imagens de crianças brincando de bolinhas de gude, de esconde-esconde, cricket, baseball e outros jogos. Publicado por John Newburry, ele foi o primeiro da editora que acabou se especializando em obras para crianças.” (L&PM).
É preciso deixar claro que o brinquedo, ao contrário do que muitos pensam, não precisa ser caro, pois vai depender da capacidade imaginativa. A criança mesmo, pode produzir suas engenhocas brincando com as possibilidades. “Ela, ao tomar o nada em suas mãos, cria um carrinho, um bichinho ou um avião (...), fruto de sua imaginação.” (SOUZA et al., 2010, p.94). Ainda que não precise necessariamente do objeto: uma música, um faz de conta podem propiciar a mesma satisfação e interesse. Não existe justificativa quando o que se almeja é uma boa brincadeira. Portanto, entre nesta roda num movimento que contribua na criação de espaços para as diferentes manifestações lúdicas. Boa leitura, bom jogo, bom divertimento!
* Monalisa Arikawa é Graduada em Comunicação Social, Pós-Graduada em Audiovisual e Tecnóloga em Produção Publicitária.
Bibliografia:
GUY, John et al. Grandes Civilizações. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2005.
L&PM. O primeiro livro infantil da história. L&PM Blog. Disponível em < http://www.lpm-blog.com.br/?p=
SOUZA, Alba Regina Battisti de et al. Formação Docente e Práticas Pedagógicas. Florianópolis: Editora da UDESC, 2010.
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/pedagogia/vamos-brincar/