Por muitos séculos, a Fé era (e não poderia ser diferente sob hipótese alguma) o principal instrumento que guiava todos os povos pelos mais diferentes caminhos: ciência, moral, relações humanas... Sobre esta Fé Cega, Martinho Lutero costumava caracterizá-la como "uma cortesã do diabo". Muitas decisões grandiosas ao longo de alguns períodos da História foram tomadas tendo a Fé como argumento principal, a tal ponto que, para os doutores do Concílio de Trento, a "fé não só excluía qualquer dúvida, mas o próprio desejo de submeter a verdade à demonstração".
O poder da fé era tão grande e devastador que norteou muitas guerras religiosas (como ainda acontece nos dias de hoje), do fanatismo intransigente e do suplício de pelo menos 30 mil mulheres acusadas de feitiçaria.
Um caso famoso, dentre as mulheres acusadas de feitiçaria estava a mãe de Johannes Kepler, Katharine. Sua acusação foi feita pela mulher de um vidraceiro que dizia ter a velha Katharine feito adoecer uma vizinha com uma poção mágica, ter lançado mau olhado nos filhos de um alfaiate que acabaram morrendo, dentre outras acusações. Para mais detalhes leia O nascimento da Ciência Moderna na Europa de Paolo Rossi (Editora Edusc).
Não estão em questão neste texto, as vantagens ou desvantagens oriundas da Fé. Apenas como a sua influência era decisiva nos rumos da humanidade de outrora.
Contudo, verdades absolutas até então começavam a serem questionadas, principalmente aquelas relacionadas à estrutura do nosso Universo. A Astronomia dava um novo passo com as idéias do clérigo Polonês Nicolau Copérnico. Para entender exatamente este novo sistema, veja o vídeo abaixo:
A idéia do Heliocentrismo era objeto de heresia. A idéia defendida pela igreja de então e adotada como verdade absoluta, estava centrada na teoria ptolemaica de que a Terra era o centro do Universo. A referida idéia passou a constituir um artigo de fé, confirmado por passagens da Bíblia; nem católicos nem protestantes poderiam contestá-la. O trecho mais citado está no livro de Josué (X, 12) onde Deus ordena que o Sol fique parado prolongando, assim a duração do dia.
O novo sistema planetário imaginado por Copérnico contradizia as idéias geocêntricas de Ptolomeu, adotadas pelos teólogos medievais que rejeitavam qualquer teoria que não conferisse à Terra o lugar central do universo. Algo importante precisa ser mencionado aqui: os teólogos medievais eram os principais detentores do conhecimento na época. Sendo assim, a idéia de tentar convencê-los de que suas crenças estariam erradas, não era tarefa tão simples.
O processo de publicação de sua idéia foi algo lento, gradual e eivado de um cuidado sem precedentes afim de que não viesse a ser punido pelo Santo Ofício. Apesar de relutar antes de tornar públicas suas idéias sobre o sistema solar, tratou de fazê-lo da maneira mais respeitosa possível em relação à ordem estabelecida. Suas argumentações, além do caráter técnico, tinham o caráter religioso: perguntava em que lugar, melhor do que o centro do sistema solar, poderia o Criador ter situado a lâmpada que ilumina o mundo. Desta forma, suas relações com a igreja nunca chegaram ao declarado antagonismo e, consequentemente, a situações conflitantes como a que Galileu enfrentou. E o motivo, dentre os já citados resumia-se no seguinte: em todas suas obras e anotações sobre a estrutura do universo, Copérnico considerava sua própria hipótese como um mero exercício geométrico.
Amigos e discípulos de Copérnico (com quem discutia o assunto tratado em suas pesquisas) incentivavam a publicação dos seus trabalhos acerca do Heliocentrismo, mas o clérigo não sentia nenhuma atração especial pela polêmica.
Outros fatores que concorreram para que Copérnico não fosse considerado herético estavam relacionados à estrutura do seu material. De Revolutionibus Orbium Coelestium (Das revoluções dos orbes celestes) foi escrita em latim. Isso, por si só, já limitava seu acesso a uma elite letrada, embora o latim fosse a língua "oficial" de todas as ciências da época. Sendo assim, este conhecimento não seria disseminado tão facilmente. Outro detalhe importante foi o seguinte: dada a erudição da obra, apenas por astrônomos e matemáticos conseguiam compreendê-la com facilidade. O prefácio (que não foi escrito por Copérnico) apresentava a teoria como simples suposição, para facilitar cálculos, não como afirmação categórica. Finalmente, o impacto da teoria foi consideravelmente retardado pelo fato de sua publicação ter sido quase póstuma; Copérnico só viu o livro pronto em seu leito de morte.
Para saber mais:
https://web.archive.org/web/20090304154432/http://www.histedbr.fae.unicamp.br:80/navegando/glossario/verb_b_nicolau_copernico.htm
O nascimento da Ciência Moderna na Europa. Paolo Rossi (Editora Edusc)
https://web.archive.org/web/20160414091749/http://www.saladefisica.cjb.net:80/
https://web.archive.org/web/20091205035809/http://homer.nuted.edu.ufrgs.br:80/tekton/grandes_fisicos/nicolau_copernico.php