Conhecido como o "Pai da Medicina Ocidental", Hipócrates foi um ícone ateniense da rejeição a explicações supersticiosas e míticas para os problemas de saúde e como curar doenças. Enquanto muitos pensadores gregos concentravam seus esforços na natureza em geral ou na moral e política, Hipócrates concentraram-se em observar e compreender o funcionamento do organismo humano, na esperança de encontrar explicações racionais, e passíveis de controle e manipulação, para os males que atingem a saúde humana. Embora muito tenha se perdido ao longo dos séculos, alguns de seus escritos sobrevivem até os dias atuais, porém, como a maior parte de seu trabalho era iminentemente prática, temos ainda assim pouco acesso ao pensamento de Hipócrates.
Hipócrates não apenas foi bem sucedido em rejeitar a superstição, mas foi também capaz de desenvolver a medicina a ponto de separá-la da Teurgia, práticas religiosas ritualísticas com objetivo de conectar-se a divindade, no caso para recuperação da saúde. A partir de Hipócrates a medicina tornou-se uma disciplina independente, o que levou ao surgimento da profissão de médico.
Embora a medicina tenha se desenvolvido como uma disciplina independente, os discípulos de Pitágoras nos dão a saber que Hipócrates utilizou a filosofia como aliada da medicina, entendendo que a abordagem racional utilizada nesta disciplina seria o tipo de abordagem adequada para tratar os males da saúde, buscando na natureza as causas e a solução. Estabeleceu que, ao invés de uma punição dos deuses, as causas da maioria das doenças seriam fatores climáticos, alimentares e hábitos cotidianos.
Os desenvolvimentos posteriores da medicina mostraram que Hipócrates estava correto, embora hoje se compreenda que ele trabalha com diversos elementos incorretos quanto a anatomia e fisiologia. Entre estes o Humorismo, a teoria de que o corpo possui quatro fluidos diferentes que quando desequilibrados levam a doenças.
Este tipo de erro devia-se especialmente ao fato de que na Grécia da época, a dissecação era um tabu, o que também dificultava o trabalho da escola de medicina da região de Cnido, baseada no diagnóstico. Tendo isto em mente, a escola Hipocrática de medicina, da região de Cós, focou seus trabalhos no prognóstico e cuidado com o paciente, atingindo assim maior eficácia em tratar as doenças, mesmo com uma visão incorreta de muitos aspectos do corpo humano e um diagnóstico generalista combinado a tratamentos passivos. Com a imaturidade da medicina da época, Hipócrates e seus sucessores acreditavam que o melhor que o terapeuta poderia fazer seria prever o desenvolvimento da doença, baseado em dados previamente coletados, e facilitar o processo de recuperação natural do corpo, pois acreditava-se que o corpo humana possuía a capacidade de reequilibrar os quatro fluidos por si mesmo, de modo que, na maioria dos casos, o papel do terapeuta seria manter o paciente o mais limpo e estéril possível, imobilizando conforme a necessidade e evitando o uso de drogas potentes, o que era reservado para casos críticos.
Especialmente devido aos tratamentos passivos, Hipócrates tem sido criticado nos últimos dois milênios, sendo que a medicina atual aproximasse muito mais da escola de Cnido do que da escola de Cós, visto que hoje possuímos o conhecimento fisiológico e anatômico que lhes faltava.
Um conceito importante para o método de Hipócrates era o de "crise". Um ponto de progressão da doença ou da cura do paciente que determinava se ele se recuperaria ou morreria. Durante o processo de cura mais de uma crise era esperada, sempre sucedida por um período de recaída.
Hipócrates é também creditado como tendo criado o juramento de Hipócrates, utilizado hoje para a profissão de medicina, embora alguns autores afirmem que o juramento é posterior.
Referências bibliográficas:
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