No direito, jurisprudência pode significar 1) o estudo das características e origens das leis, e 2) o universo de decisões proferidas por autoridades do Judiciário sobre um determinado assunto. No primeiro sentido, ela é a ciência do direito empenhada em desvendar a natureza das leis, com foco nos elementos que levam uma sociedade a elaborá-las. No segundo, mais hegemônico no Brasil, ela se equipara à noção de precedente jurídico, como visto em nações de tradição legal anglo-saxônica (direito comum). No Judiciário brasileiro (direito civil, de tradição romano-germânica), seu papel e influência são intensamente debatidos, embora o consenso seja de que seu caráter é limitado pela ênfase brasileira na lei codificada e rígida.
Como estudo da fonte legal, a jurisprudência moveu inúmeros pensadores com questionamentos sobre as raízes, a utilidade e o valor (moralidade) das leis, dando luz às várias teorias do direito. Na idade moderna, as de maior destaque são o jusnaturalismo (ou direito natural), o juspositivismo (ou positivismo jurídico), o direito das nações (direito internacional) e os direitos comum e civil. Destes, o jusnaturalismo é o mais antigo, defendendo que as leis refletem características inatas da humanidade. Embora interpretações maliciosas possam defender leis cruéis com base na suposta "natureza humana", o jusnaturalismo teve enorme peso na evolução do direito comum e dos direitos humanos, cuja base dignidade inata dos indivíduos. Já o juspositivismo crê que a principal fonte da lei é a ação humana, refletindo os contextos históricos e sociais de quando foram elaboradas.
Jusnaturalismo e juspositivismo são fontes essenciais dos direitos comum e civil, nos quais o segundo sentido de jurisprudência ganha corpo. O direito comum é aquele baseado nos costumes da sociedade, acomodando com maior flexibilidade suas mudanças. Por depender menos da lei escrita, o judiciário baseia-se em precedentes, ou seja, nas decisões passadas das cortes para julgar um caso semelhante. Já o direito civil, cujos maiores exemplos históricos são o Código de Justiniano (Corpo de Direito Civil) e o Código Napoleônico, a ênfase é na lei escrita e dogmática, aquela elaborada por autoridades competentes e decretada para o resto da sociedade. Embora mais objetivo, sua formalidade e rigidez dão pouco espaço para os precedentes, que se tornam meros instrumentos de consulta.
No Brasil, a jurisprudência pode abordar todas as decisões judiciais, divergentes ou não, sobre um caso (jurisprudência em sentido amplo) ou apenas o conjunto de decisões idênticas (sentido estrito). Com o notório inchaço do judiciário e a presença de um código legal volumoso, frequentemente ambíguo e contraditório, muito se discute sobre o papel da jurisprudência em sentido estrito na resolução dos casos. Infelizmente, em sua atual forma, o direito brasileiro dispõe de poucos instrumentos que a incorporem nos processos jurídicos, conservando sua função primária de consulta.
O advento da súmulas, contudo, e especialmente das súmulas vinculantes, é uma das conquistas mais importantes neste sentido. Geralmente emitidas por tribunais de alta instância, as súmulas expressam o entendimento de seus magistrados sobre determinado processo, visando a orientar outros tribunais em processo idênticos ou similares. Assim, súmulas se tornam uma jurisprudência com mais sólido corpo legal, embora não exijam que outros tribunais sigam suas recomendações, nem mesmo aqueles que as emitiram. Seu caráter, pois, permanece consultivo / instrutivo, o que foi parcialmente remediado com a introdução das súmulas vinculantes na Reforma do Judiciário de 2004 (Emenda Constitucional nº 45). Um instrumento de jurisprudência com efeito de vínculo, elas forçam os tribunais a seguir seu entendimento. Ainda assim, são uma atribuição exclusiva do Supremo Tribunal Federal, que as usa primariamente para sanar divergências de matéria constitucional.
Referências bibliográficas:
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