O escurecimento global é uma redução na quantidade de irradiação solar direta que penetra a atmosfera e atinge a superfície do planeta. Este efeito foi notado desde o início de sua documentação nos anos 1950, quando institutos iniciaram as medições sistemáticas de irradiação. Ele acomete de maneiras diferentes a superfície do globo, sendo mais intenso em alguns locais do que em outros (variando em uma taxa de redução de penetração de luz de 5 a 20%).
Em tempos pré-históricos, o mundo provavelmente experimentou diversos períodos de escurecimento atmosférico intenso, associado principalmente a atividade vulcânica. Grandes erupções são capazes de lançar na atmosfera quantidades muito elevadas de cinzas e partículas que demoram algum tempo até serem degradadas ou sedimentadas. Entretanto, a causa mais plausível para o escurecimento global da atualidade está ligada a poluição causada por ação humana. Aerossóis e partículas provenientes de processos de combustão poluem a atmosfera, impedindo a entrada de luz e afetando o ciclo hidrológico.
As nuvens, quando formadas naturalmente, são um componente essencial na distribuição de umidade e estabelecimento de uma frequência para o regime pluviométrico. Porém, o acúmulo de poluentes tem causado a formação de nuvens a partir de poeira e materiais particulados, o que forma nuvens com menor conteúdo de gotículas de água (nuvens marrons) que acabam sendo mais refletivas, contribuindo para o fenômeno do escurecimento e reduzindo o volume final de chuva.
A queimada de florestas e restos vegetais e a combustão incompleta de combustíveis (em veículos e maquinários industriais) liberam na atmosfera o chamado “carbono negro” ou fuligem. Nas camadas elevadas da atmosfera, essa fuligem absorve radiação solar, reduzindo a iluminação e elevando a temperatura. Mas esse efeito é geralmente observado a quilômetros de distância da fonte poluidora de origem, o que cria graves problemas inter-regionais. Por exemplo, grande parte da poluição liberada pela Índia afeta os países do Oriente Médio devido ao carreamento das partículas por correntes de ar. O mesmo é observado nos Estados Unidos, onde a costa oeste tem sofrido nos últimos anos um forte aquecimento e escurecimento atmosférico enquanto a costa leste apresenta temperaturas mais amenas. Ou seja, locais que ficam longe da rota dos ventos carreadores de partículas de poluição podem apresentar um leve resfriamento, o que fortalece os argumentos infundados de negacionistas do aquecimento global.
O escurecimento do planeta e o aquecimento global
É importante ressaltar que o escurecimento do planeta tem relação com o aquecimento global. Por induzir a formação de zonas de resfriamento, em que os poluentes são carreados por correntes de ar, o escurecimento pode mascarar os efeitos de aquecimento, pelo menos em escalas regionais. Somente nas últimas décadas é que pesquisadores conseguiram estabelecer relações diretas entre esses efeitos, contribuindo para a compreensão de que o escurecimento global pode, em última instância, agravar o quão quente o futuro será. Devido a formação de nuvens marrons, contendo gotas de água menor, o escurecimento global leva ao bloqueio de luz solar que contribuiria para uma maior evaporação na superfície terrestre, reduzindo o vapor de água que se converte em chuva. Esta, por sua vez, tem um importante efeito de limpeza e carreamento de poluentes da atmosfera. Contudo, com menos chuva, há um acumulo desses poluentes atmosféricos que causarão ainda mais aquecimento.
Além dos efeitos discutidos acima, o escurecimento global causa um agravamento da crise hídrica de muitos locais do mundo, pois o ciclo da água tem como força motriz a luz solar, que é o agente indutor da evaporação. Diversos países da África subsaariana vêm sofrendo com o agravamento da escassez de alimento e água potável devido ao acumulo de poluentes vindos do hemisfério norte. Chuvas regionais similares à estação de monção observada no sudeste asiático formavam um cinturão pluviométrico tropical que abastecia os países do centro do continente africano com água e temperaturas mais amenas. Contudo, o escurecimento atmosférico desta região observado desde os anos 1970 causou mudanças drásticas no padrão climático regional. Este é o melhor exemplo para demonstrar que nosso planeta é intensamente interligado e que as consequências de ações de um local podem afetar populações distantes.
Referências:
Liley, J.B., 2006. Global dimming, clouds and aerosols. UV Radiation and Its Effects: An Update, pp.14-15.
Ramanathan, V., 2007. Global dimming by air pollution and global warming by greenhouse gases: global and regional perspectives. In Nucleation and atmospheric aerosols (pp. 473-483). Springer, Dordrecht.
Wild, M., Ohmura, A. and Makowski, K., 2007. Impact of global dimming and brightening on global warming. Geophysical Research Letters, 34(4).
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/ecologia/escurecimento-global/