Responsável pela captura de 50% do pescado consumido no mundo, a pesca industrial caracteriza-se pela produção em larga escala e alto investimento em tecnologia. Assim como outros setores da indústria alimentícia, esta atividade é fortemente influenciada pela demanda do mercado, focando na captura de espécies mais rentáveis (lucrativas).
A indústria pesqueira compreende um baixo número de espécies-alvo: cem espécies perfazem 70% da captura mundial, enquanto a produção total (100%) corresponde a 200 espécies. Tal padrão pode ser considerado um reflexo dos requisitos necessários à uma espécie para que esta seja considerada um bom recurso pesqueiro, viabilizando assim sua exploração. Entre estes, pode-se citar a alta densidade da espécie, que resultaria em capturas rentáveis; considerável estoque pesqueiro e captura potencial, a fim de incentivar investimentos e manter desembarques em níveis razoáveis; e produto final de fácil comercialização. Neste sentido, as principais espécies-alvo da indústria pesqueira são a anchoveta peruana (Engraulis ringens), o bacalhau do Alasca (Theragra chalcogramma), o xixarro chileno (Trachurus murphyi) e a sardinha do Atlântico (Clupea harengus), todas severamente afetadas pela sobrepesca e/ou mudanças climáticas.
De acordo com dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), 90% do pescado mundial é produzido por cerca de 20 países, dentre os quais destacam-se a China (como o maior produtor mundial), o Peru, Chile e Japão. Em relação às nações latinas (Chile e Peru), a captura de pescado ocorre na área de ressurgência do Pacífico Sul, assim como na linha de costa destes países. Nesta região ocorre a pesca de anchoveta peruana e xixarro chileno, duas das principais espécies-alvo da indústria pesqueira, que, embora apresente embarcações adaptadas para alto-mar, captura cerca de 50% do pescado convencional comercializado no mundo em zonas de ressurgência e plataforma continental. Entre as técnicas de captura utilizadas por esta indústria estão redes de cerco de grande porte, e espinhéis com 130 km de extensão e milhares de anzóis.
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Desenvolvimento da pesca industrial
A indústria pesqueira iniciou sua expansão no século 20, após a Revolução Industrial. Inovações tecnológicas como o motor a vapor e o casco de aço tornaram as embarcações mais rápidas, seguras e autônomas, permitindo a exploração de regiões oceânicas com condições desfavoráveis. Além disso, o desenvolvimento de técnicas de captura como a rede de arrasto, o uso de gelo para conservação do pescado, técnicas de enlatamento e a criação de ferrovias e novos mercados nos centros urbanos, favoreceram a preservação, distribuição e comercialização do recurso pesqueiro. No entanto, até a Segunda Guerra Mundial, tais inovações eram restritas aos países industrializados do Hemisfério Norte, que concentravam seus esforços de pesca sobre as espécies demersais. Com o fim da guerra, a indústria pesqueira adaptou várias tecnologias militares à suas embarcações, como radares e sonares, que possibilitaram a navegação em condições de baixa visibilidade e a detecção de cardumes em altas profundidades, respectivamente. A navegação eletrônica e o sistema de posicionamento por satélite também permitiram aos barcos localizar, com uma precisão de 15m, grandes concentrações de peixes. Esta modernização dos equipamentos inverteu o foco da indústria: ao final da década de 70, a captura de espécies pelágicas já representava o dobro das espécies demersais, e 90% de seu volume era destinado à fabricação de farinha de peixe. Entre 1900-1970, o setor pesqueiro entrou em rápida expansão, elevando a produção mundial de pescado de 4 para 70 milhões de toneladas anuais, taxa de crescimento muito superior a qualquer outra indústria alimentícia no mundo. No entanto, a partir de 1972, o declínio nos estoques de espécies-alvo como a anchoveta peruana, marcou a redução no crescimento desta indústria, que encontra-se atualmente estagnada.
No Brasil
A indústria pesqueira iniciou seu desenvolvimento no país a partir de 1960, através de incentivos fiscais do governo, que tinha como objetivo o mercado externo. Durante este período ocorreu a expansão do parque industrial voltado para o processamento de pescado, viabilizando a produção e comercialização de produtos eviscerados, filetados e congelados, e o enlatamento de espécies como sardinhas e atuns. No entanto, na década de 80, a sobrepesca e a falta de políticas de manejo levaram à redução da produção pesqueira, marcada por flutuações expressivas na captura de pescado: em 1985 esta atingiu 760 mil toneladas, declinando até 429 mil t em 1990. Atualmente, o maior polo industrial pesqueiro do país situa-se em Itajaí, Santa Catarina, onde, entre outras espécies, ocorre a exploração da sardinha verdadeira (Sardinella brasiliensis).
Cenário atual
Embora a produção pesqueira mundial encontre-se estagnada há alguns anos, o custo dos materiais (barcos, redes, tecnologia de pesca e combustível) aumenta esporadicamente. Esta relação produção x custo tem se tornado uma problemática, visto que a indústria pesqueira têm contraído grandes dívidas com o governo, que oferece subsídios e linhas de crédito a fim de manter a produção pesqueira. Desta forma, o setor industrial superexplora os estoques tradicionais de pescado (acarretando na sobrepesca, fenômeno que já atinge 70% do recurso pesqueiro mundial), e passa a invadir zonas costeiras, prejudicando a pesca artesanal de subsistência. A sardinha do Atlântico e a anchoveta peruana são exemplos de espécies afetadas pela sobrepesca, e encontram dificuldades para a recuperação total de seus estoques até os dias atuais. Desta forma, com o objetivo de proteger o recurso pesqueiro, organizações internacionais têm adotado “Princípios precautórios” que consistem na redução de 30 a 40% do esforço de pesca mundial, utilização de aparelhos de pesca mais seletivos (a fim de diminuir o grande volume de descarte da indústria pesqueira) e a implementação de áreas marinhas protegidas de exclusão total (santuários) ou parcial (reservas extrativistas) da pesca para recuperação dos estoques.
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Referências:
Biologia Marinha. Pereira, R. C., & Soares-Gomes, A. (2002). Rio de Janeiro: Interciência, 2, 608.
World Fish Org: Industrial Fishery. http://www.worldfish.org/GCI/gci_assets_moz/Fact%20Card%20-%20Industrial%20Fishery.pdf