A origem da vida é uma questão que até hoje permanece em aberto. Entretanto, dentre as várias teorias já propostas, muitas já caíram em descrédito com a expansão do conhecimento científico. É o caso da teoria da geração espontânea ou abiogênese, que por muito tempo foi a hipótese mais aceita. Segundo esta teoria, organismos podiam ser gerados espontaneamente a partir de matéria sem vida.
No século XVII acreditava-se que organismos vermiformes encontrados em cadáveres surgiam por transformação espontânea da carne em putrefação, ou seja, de acordo com a teoria da abiogênese. Até que, em 1668, o médico italiano Francesco Redi, não convencido com esta explicação, decidiu testar a hipótese de que tais organismos eram provenientes de ovos colocados por moscas. Redi colocou pedaços de carnes em frascos, deixando alguns abertos e outros vedados com gaze e, como esperava, não demorou muito para que larvas surgissem nos frascos que permaneceram abertos. Já naqueles que permaneceram vedados — nos quais as moscas não puderam entrar —, mesmo após dias, nenhum “verme” surgiu. Os experimentos de Redi fizeram a teoria da abiogênese perder bastante credibilidade, mas ela voltou a ser evocada para explicar a origem dos microorganismos, descobertos por volta do século XVII por Antonie van Leewenhoek.
Para testar a hipótese da abiogênese nos microorganismos, em 1745, o naturalista inglês John Needham fez o seguinte experimento: separou um caldo nutritivo em vários frascos e os ferveu por 30 minutos, fechando imediatamente com rolhas de cortiça. Passados alguns dias, os frascos foram tomados por microorganismos e Needham assumiu que a única explicação plausível era a geração espontânea, já que a fervura deveria eliminar qualquer organismo pré-existente no caldo e a rolha impediria a contaminação por qualquer ser vivo proveniente do meio externo. Em 1770, o padre e pesquisador italiano Lazzaro Spallanzani refez os experimentos de Needham, porém fechou alguns frascos com rolhas de cortiça — tal qual no experimento de Needham — e outros com uma vedação hermética. Após ferver os frascos por um longo período, microorganismos surgiram apenas nos frascos fechados com rolhas, o que levou Spallanzani a concluir que o tempo de fervura ou a vedação usados no experimento de Needham não tinham sido suficientes para impedir a contaminação. Needham argumentou que a fervura prolongada teria levado à perda de “força vital” do caldo — fator que seria essencial para o surgimento da vida. Spallanzani então desfez a vedação dos frascos que estavam hermeticamente fechados, que em pouco tempo foram tomados pelos microorganismos, confrontando a justificativa de Needham, que então sugeriu então que a força vital havia sido restabelecida com a entrada de ar fresco. Needham saiu da polêmica fortalecido pois Spallanzani não conseguiu elaborar um experimento que rejeitasse seu novo argumento.
A polêmica da abiogênese em microorganismos só teve fim na década de 1860, quando a Academia Francesa de Ciências ofereceu um prêmio em dinheiro para quem conseguisse realizar um experimento definitivo sobre o assunto. Motivado pelo prêmio, o pesquisador francês Louis Pasteur, elaborou um experimento similar ao de Needham e Spallanzani, mas utilizou frascos com gargalos em forma de pescoço de cisne — que permitiam a entrada de ar, mas retiam partículas em suspensão nas paredes de seus gargalos curvos. Mesmo em contato direto com o ar, não surgiram microorganismos em nenhum dos frascos do experimento de Pasteur. Ao quebrar o gargalo de alguns dos frascos, no entanto, os caldos foram tomados por microorganismos em poucos dias. Assim, Pasteur conseguiu finalmente demonstrar que os microorganismos em caldos nutritivos não surgem por geração espontânea, mas através da contaminação pelo ambiente externo.
Origem da vida na Terra primitiva
Isso levou ao descrédito da abiogênese — pelo menos da forma como se acreditava inicialmente — e a biogênese se consolidou, ficando claro para os cientistas que os seres vivos podem surgir apenas de outros seres vivos preexistentes. Entretanto, isso levou a uma nova questão: como então teria surgido o primeiro ser vivo? A teoria da biogênese fornece explicações apenas sobre como os seres vivos são gerados nas condições atuais do nosso planeta, mas não sobre como surgiu a vida na terra pela primeira vez. A teoria da evolução molecular, uma das teorias atualmente mais aceitas para explicar a origem da vida — que defende que as substâncias químicas presentes na Terra primitiva teriam originado moléculas orgânicas precursoras dos primeiros seres vivos — se trata de um processo abiogênico, que pode ter ocorrido pelo menos uma única vez na história da Terra.
Referências:
Amabis, J.; Martho, G. Biologia moderna Amabis & Martho. Manual do Professor. 1ª Edição. São Paulo: Editora Moderna. 2016.
Lopes, S.; Rosso, S. Biologia: volume único. Editora Saraiva. 2005.