Selecionamos as questões mais relevantes da prova de vestibular VUNESP 2018/1. Confira! * Obs.: a ordem e número das questões aqui não são iguais às da prova original.
Leia o trecho do conto “Pai contra mãe”, de Machado de Assis (1839-1908).
A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé; havia também a máscara de folha de flandres. A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a boca. Tinha só três buracos, dois para ver, um para respirar, e era fechada atrás da cabeça por um cadeado. Com o vício de beber, perdiam a tentação de furtar, porque geralmente era dos vinténs do senhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí ficavam dois pecados extintos, e a sobriedade e a honestidade certas. Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas. Mas não cuidemos de máscaras.
O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também, à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pegado.
Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão. Sucedia ocasionalmente apanharem pancada, e nem todos gostavam de apanhar pancada. Grande parte era apenas repreendida; havia alguém de casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso, o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói. A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que seguiam para casa, não raro, apenas ladinos, pediam ao senhor que lhes marcasse aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando.
Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse. Punha anúncios nas folhas públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico, se o tinha, o bairro por onde andava e a quantia de gratificação. Quando não vinha a quantia, vinha promessa: “gratificar-se-á generosamente” – ou “receberá uma boa gratificação”. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem o acoitasse.
Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser instrumento da força com que se mantêm a lei e a propriedade, trazia esta outra nobreza implícita das ações reivindicadoras. Ninguém se metia em tal ofício por desfastio ou estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para outros trabalhos, o acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o impulso ao homem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem. (Contos: uma antologia, 1998.)
O leitor é figura recorrente e fundamental na prosa machadiana. Verifica-se a inclusão do leitor na narrativa no seguinte trecho:
“A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade.” (3º parágrafo)
“Quando não vinha a quantia, vinha promessa: ‘gratificar-se-á generosamente’ – ou ‘receberá uma boa gratificação’. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa.” (4º parágrafo)
“Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé; havia também a máscara de folha de flandres.” (1º parágrafo)
“O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também, à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave.” (2º parágrafo)
“Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas.” (1º parágrafo)
Em “o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói.” (3º parágrafo), a “ação” a que se refere o narrador diz respeito:
à fuga dos escravos.
ao contrabando de escravos.
aos castigos físicos aplicados aos escravos.
às repreensões verbais feitas aos escravos.
à emancipação dos escravos.
Embora não participe da ação, o narrador intromete-se de forma explícita na narrativa em:
“Há meio século, os escravos fugiam com frequência.” (3º parágrafo)
“O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões.” (2º parágrafo)
“A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a boca.” (1º parágrafo)
“Mas não cuidemos de máscaras.” (1º parágrafo)
“Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão.” (3º parágrafo)
“Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse.” (4º parágrafo)
Na oração em que está inserido, o termo destacado é um verbo que pede:
apenas objeto direto, representado pelo vocábulo “lho”.
objeto direto e objeto indireto, ambos representados pelo vocábulo “lho”.
objeto direto, representado pelo vocábulo “dinheiro”, e objeto indireto, representado pelo vocábulo “lho”.
apenas objeto indireto, representado pelo vocábulo “quem”.
objeto direto, representado pelo vocábulo “dinheiro”, e objeto indireto, representado pelo vocábulo “quem”.
Em “Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem o acoitasse.” (4º parágrafo), o termo destacado pode ser substituído, sem prejuízo de sentido para o texto, por:
escondesse.
denunciasse.
agredisse.
incentivasse.
ignorasse.
No último parágrafo, “pôr ordem à desordem” significa:
estimular os proprietários a tratarem seus escravos com menos rigor.
conceder a liberdade aos escravos fugidos.
conceder aos proprietários de escravos fugidos alguma compensação.
abolir a tortura imposta aos escravos fugidos.
restituir os escravos fugidos a seus proprietários.
De fato, este romance constitui um dos poucos romances cômicos do romantismo nacional, afastando-se dos traços idealizantes que caracterizam boa parte das obras “sérias” dos autores de então. O modo pelo qual este romance pinta a sociedade, representado-a a partir de um ângulo abertamente cômico e satírico, também era relativamente novo nas letras brasileiras do século XIX. (Mamede Mustafa Jarouche. “Galhofa sem melancolia”, 2003. Adaptado.)
O comentário refere-se ao romance:
O cortiço, de Aluísio Azevedo.
Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis.
Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida.
Iracema, de José de Alencar.
Macunaíma, de Mário de Andrade.
Leia o trecho do livro Bem-vindo ao deserto do real!, de Slavoj Žižek.
Numa antiga anedota que circulava na hoje falecida República Democrática Alemã, um operário alemão consegue um emprego na Sibéria; sabendo que toda correspondência será lida pelos censores, ele combina com os amigos: “Vamos combinar um código: se uma carta estiver escrita em tinta azul, o que ela diz é verdade; se estiver escrita em tinta vermelha, tudo é mentira.” Um mês depois, os amigos recebem uma carta escrita em tinta azul: “Tudo aqui é maravilhoso: as lojas vivem cheias, a comida é abundante, os apartamentos são grandes e bem aquecidos, os cinemas exibem filmes do Ocidente, há muitas garotas, sempre prontas para um programa – o único senão é que não se consegue encontrar tinta vermelha.” Neste caso, a estrutura é mais refinada do que indicam as aparências: apesar de não ter como usar o código combinado para indicar que tudo o que está dito é mentira, mesmo assim ele consegue passar a mensagem. Como? Pela introdução da referência ao código, como um de seus elementos, na própria mensagem codificada. (Bem-vindo ao deserto do real!, 2003.)
A “introdução da referência ao código, como um de seus elementos, na própria mensagem codificada” constitui um exemplo de:
eufemismo.
metalinguagem.
intertextualidade.
hipérbole.
pleonasmo.
“Um mês depois, os amigos recebem uma carta escrita em tinta azul [...].”
Assinale a alternativa que expressa, na voz passiva, o conteúdo dessa oração.
Um mês depois, uma carta escrita em tinta azul seria recebida pelos amigos.
Os amigos deveriam ter recebido, um mês depois, uma carta escrita em tinta azul.
Um mês depois, uma carta escrita em tinta azul foi recebida pelos amigos.
Um mês depois, uma carta escrita em tinta azul é recebida pelos amigos.
Os amigos receberiam, um mês depois, uma carta escrita em tinta azul.
Na Europa, os artistas continuam a explorar caminhos traçados pelos primeiros pintores abstratos. Mas a abstração desses artistas não é geométrica: sua pintura não representa nenhuma realidade, tampouco procura reproduzir formas precisas. Cada artista inventa sua própria linguagem. Cores, formas e luz são exploradas, desenvolvidas e invadem as telas. Traços vivos e dinâmicos... Para cada um, uma abstração, um lirismo. (Christian Demilly. Arte em movimentos e outras correntes do século XX, 2016. Adaptado.)
O comentário do historiador Christian Demilly aplica-se à obra reproduzida em: