DNA Mitocondrial

Por Joice Silva de Souza

Mestre em Dinâmica dos Oceanos e da Terra (UFF, 2016)
Graduada em Biologia (UNIRIO, 2014)

Categorias: Genética
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As células eucarióticas contêm dois tipos de DNA: o nuclear, originado a partir da combinação entre cromossomos provenientes de indivíduos do sexo masculino e feminino, e o mitocondrial, que corresponde ao material genético transferido apenas por indivíduos do sexo feminino (i.e. herança matrilinear).

Características

O DNA mitocondrial (mtDNA) é caracterizado por um cromossomo circular, em contraste ao material genético linear presente no núcleo, e encontra-se alocado na matriz mitocondrial. Este genoma é formado por uma fita dupla de DNA em formato de hélice, e contém 37 genes, formados a partir de 16.569 pares de bases. A tradução deste material resulta em 13 diferentes proteínas, que atuam como subunidades de complexos enzimáticos que formam o sistema de fosforilação oxidativa, permitindo que a mitocôndria produza energia para a sobrevivência celular; 22 tipos de RNA transportador; e 2 tipos de RNA ribossômico. Apesar da ocorrência de genes na mitocôndria, são necessárias ainda proteínas codificadas a partir do DNA nuclear para que o processo de produção de energia celular (através da quebra de ATP) funcione corretamente.

Outra característica do DNA mitocondrial que o diferencia do nuclear, consiste na disposição deste cromossomo na matriz mitocondrial: como apresenta formato circular, o DNA mitocondrial não se encontra condensado em forma de cromatina, como ocorre com o DNA nuclear, que se apresenta parcialmente alongado apenas durante o processo de transcrição. A transcrição e tradução de genes presentes no DNA mitocondrial também apresenta particularidades em relação à sequência nuclear: apenas 3% do material genético mitocondrial não codifica proteínas, em contraste a 93% do genoma nuclear.

Além disso, os nucleotídeos presentes no DNA mitocondrial podem apresentar uma sobreposição funcional durante o processo de tradução: isto significa que um mesmo nucleotídeo pode atuar como a última base que codifica um gene (A, por exemplo), e como a primeira base que codifica o próximo (B, por exemplo), visto que a tradução do genoma mitocondrial ocorre de forma contínua (i.e. um grande RNA mitocondrial dá origem à todas as proteínas), ao contrário do que é observado para o DNA nuclear (i.e. vários RNAs nucleares dão origem à diferentes proteínas).

Organização do DNA mitocondrial humano. Ilustração: jhc  / via Wikimedia Commons (adaptado)

Mutações e sequenciamento genético

O DNA mitocondrial está presente de forma numerosa nas mitocôndrias contidas em cada célula eucariótica, enquanto apenas uma unidade de DNA nuclear é observada por célula. Esta e outras características tornam este genoma mais propenso a sofrer mutações em comparação ao DNA nuclear e, por isso, este é amplamente utilizado como marcador para diferenciar populações e espécies em estudos genéticos. No entanto, estas mutações podem levar à distúrbios genéticos maléficos, como a síndrome de Kearns-Sayre em humanos.

Esta doença ocorre como resultado de grandes deleções do DNA mitocondrial, que impedem estas organelas de realizar seu trabalho de extração de energia. Entretanto, cabe ressaltar que distúrbios causados por mutações no DNA mitocondrial não são transmitidos de pai para filho, visto que as mitocôndrias são fornecidas apenas pelo ancestral materno.

Herança matrilinear

O DNA mitocondrial representa uma valiosa ferramenta para rastrear a linhagem matrilinear na espécie humana, ou seja, a linha de descendência de um indivíduo através de uma sucessão de ancestrais femininos. Isto acontece porque a transmissão de DNA mitocondrial para o novo indivíduo (zigoto) se dá através do progenitor materno (i.e. mãe), visto que as mitocôndrias presentes no gameta masculino (espermatozoide) encontram-se localizadas em seu flagelo, o qual é perdido no momento em que o espermatozoide se liga às proteínas da zona pelúcida que envolve o ovócito secundário. Por causa disto, o DNA mitocondrial vem sendo usado inclusive em julgamentos na área de direitos humanos, visto que é extremamente útil para identificar indivíduos que foram separados de suas famílias, além de ter sido a base para a descoberta da Eva mitocondrial, descrita em 1987 por três biólogos na revista científica Nature.

Referências:

Eureka Brasil: Ciência escrita por cientistas e educadores. Disponível em: http://eurekabrasil.com/Eva-mitocondrial-matriarca-da-humanidade/

Khan Academy. Herança do DNA mitocondrial e cloroplástico. Disponível em: https://pt.khanacademy.org/science/biology/classical-genetics/sex-linkage-non-nuclear-chromosomal-mutations/a/mitochondrial-and-chloroplast-dna-inheritance

Scitable by Nature Education. mtDNA and Mitochondrial Diseases. Disponível em: https://www.nature.com/scitable/topicpage/mtdna-and-mitochondrial-diseases-903/

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