Após o declínio do Império Romano, no período que ficou conhecido como era medieval, houve um avanço no processo de consolidação da fé cristã na Europa. Os mais diversos setores da vida social foram afetados pelo domínio cristão, entre eles, a prática da medicina. Naquele momento, os limites culturais entre fé e ciência eram inconcebíveis, de modo que as concepções sobre a origem e a cura das doenças não se separavam da dimensão espiritual. Portanto, era comum que uma mesma pessoa atuasse como filósofo natural, astrólogo, teólogo e físico.
A unificação de teorias médicas começou a se desenvolver logo após a queda do Império Romano, baseada grandemente nos tratados dos médicos gregos sobre Higiene, Patologia, Fisiologia e Farmacologia. Por meio da prática de dissecações, os médicos medievais puderam ter avanços em seus estudos sobre anatomia humana. Nesse sentido, realizaram descobertas sobre a função da bexiga, dos rins, das válvulas do coração e da maneira como a coluna vertebral controlava os músculos.
Introdução de estudos e traduções islâmicos na Europa
No contexto da Alta Idade Média, por volta do século VII, Isidoro de Sevilha escreveu uma obra de grande impacto em sua época, valorizando a medicina como segunda filosofia; denominada Etimologias (século VII), propunha a restauração da energia vital, considerada o legítimo gente de cura e manutenção da saúde.
A partir do século XI, a medicina ocidental passou a ser considerada o mesmo que physica, ou seja, estudo natural. Este período foi marcado pela expansão do Império Árabe pela Europa, o que proporcionou que alguns tratados médicos e filosóficos dos gregos e bizantinos fossem levados ao continente europeu, influenciando suas práticas médicas.
Portanto, foi crucial para o trabalho investigativo dos universitários de medicina na Europa a divulgação e tradução de uma coletânea de textos médicos gregos e árabes para o latim, no século XII, sobretudo na cidade de Toledo. O acesso a estes trabalhos trouxe o acréscimo dos regimes de saúde da medicina árabe, que influenciaram a produção de variações nos formatos e conteúdos dos tratados científicos da época.
Segundo a historiadora Dulce Amarante dos Santos, foi entre os séculos XI e XIII, que houve na Europa a “difusão e a institucionalização de uma medicina fundamentada em um saber teórico e submetida a um controle dos seus práticos.” (SANTOS. p. 124. 2013).
A primeira Universidade de Medicina foi a Escola de Salerno, cujo nome é o da cidade italiana. A partir do aparecimento de novas universidades na Europa, nos meados do século XII e ao longo do XIII, uma minoria de intelectuais, entre eles Pedro Hispano (1215-1277) - nome acadêmico do Papa João XXI, transformou a saúde humana em objeto de especulação e preocupação social. Hispano fazia parte do seleto grupo de "homens de saber" que ocupavam as universidades e lidavam de forma racional com os fenômenos da natureza e o plano teórico.
Referências:
ARNAUT, Salvador Dias. A medicina. In: História da Universidade em Portugal. Coimbra: Universidade de Coimbra; Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. p. 285-302.
MEIRINHOS, J. F. Ecos da renovação filosófica no século XII em Portugal: a cultura que vem da Europa e o legado árabe. In: Actas do 2º. Congresso Histórico de Guimarães, 1996, pp.153-170
SANTOS, Dulce O. Amarante dos; FAGUNDES, Maria Daílza da Conceição. Saúde e dietética na medicina preventiva medieval: o regimento de saúde de Pedro Hispano (século XIII). História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.17, n.2, abr.-jun. 2010, p.333-342.
SANTOS, Dulce O. Amarante dos; Os saberes da medicina Medieval. História Revista, v. 18, n. 1. Goiás, 2014.