O governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) estava comprometido com a continuação da implementação da agenda neoliberal no Brasil. Essa agenda proposta pelo Consenso de Washington, em 1989, orientava ajustes nas políticas econômicas dos “países em desenvolvimento”. Dentre as dez regras indicadas pelo Consenso de Washington estavam as “privatizações das estatais” e o “investimento estrangeiro direto, com eliminação de restrições”. Essas medidas já vinham sido seguidas por governos anteriores como de Fernando Collor de Mello (1990-1992) e Itamar Franco (1992-1995). No entanto, no governo FHC essas práticas foram seguidas mais rigorosamente. Entre os anos de 1991 e 2002 foram privatizadas 165 empresas estatais.
As privatizações de empresas estatais e a entrada de capital estrangeiro no país marcaram, principalmente, o primeiro mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998). Para regular o processo de “privatizações das estatais”, em 1997, foi criada a Lei 9.491 que alterava os procedimentos do Plano Nacional de Desestatização (PND). A Lei traça seis objetivos fundamentais do PND, dentre os quais estão a redução da dívida pública líquida, modernização do parque industrial do país e o fortalecimento do mercado de capitais. A lei do PND indicava as principais práticas que reduziriam a intervenção do Estado na economia do país, viabilizando a declaração de Fernando Henrique Cardoso de que poria fim à Era Vargas, nesse pacote incluíam-se também a flexibilização das legislações trabalhistas e a redução dos direitos dos trabalhadores.
É usual nos processos de privatização as empresas estatais serem vendidas por valores muito aquéns aos que valiam. Em 1997, a Vale do Rio Doce foi vendida por R$ 3,3 bilhões, mesmo tendo faturamento anual de R$ 2 bilhões na extração de minérios. Em 1998, a Embratel foi leiloada por 8,8 bilhões, apesar de o governo ter investido R$ 21 bilhões no setor pouco antes da venda. Em 1993, a Companhia Siderúrgica Nacional foi paga, majoritariamente, por títulos da dívida pública, por R$1,05 bilhão, metade do valor estimado da empresa.
Outra prática comum no processo de privatizações das estatais foi o pagamento das empresas com títulos da dívida pública sem liquidez, ou seja, títulos negociados no mercado com grande desconto em relação ao valor designado para os títulos. Além dos valores irrisórios pelos quais foram vendidas as empresas estatais, reduzindo consideravelmente o patrimônio nacional, o recebimento de moedas com valores depreciados no mercado aumentou ainda mais as perdas estatais.
O objetivo de reduzir a dívida pública com as privatizações das empresas estatais não foi alcançado, pelo contrário, houve, inclusive, aumento da dívida interna e da dívida externa. A dívida interna foi gerada, principalmente, pelo recebimento de moedas podres e pela perda dos dividendos que deixaram de ser obtidos por essas empresas; e a dívida externa foi acumulada com os empréstimos estrangeiros para financiar a compra das estatais pelo setor privado. No Brasil, a dívida pública que em 1994 foi de R$ 153,2 bilhões passou a R$ 850 bilhões no final do governo de Fernando Henrique Cardoso (2002).
Os setores mais atingidos pela privatização foram o de telecomunicações, o de distribuição de energia elétrica, o financeiro, de transportes, rodoviário e o da mineração. O governo tentava justificar a privatização de empresas nesses setores com a promessa da redução de tarifas e a modernização dos serviços. Também se argumentava que a gestão pública dessas empresas não obtinha lucros para o Estado, contudo, muitas empresas estatais, as quais se diziam deficitárias, foram vendidas com dinheiro em caixa. Esses foram os casos, por exemplo, da Telesp (R$ 1 bilhão em caixa) e da Vale do Rio Doce (R$ 700 milhões em caixa).
Apesar dessas expectativas geradas pelo discurso pró-privatizações, as taxas aumentaram e os serviços permaneceram precários. O Estado arcou com as dívidas trabalhistas geradas pelas demissões de funcionários, além de outros encargos, e as empresas que compraram as estatais lucraram com altos reajustes de tarifas feitos às pressas em momentos próximos aos leilões. Esses foram os casos das empresas Fepasa (ferroviária) e Light (energia elétrica). O governo arcou com as dívidas trabalhistas de mais de dez mil funcionários demitidos da Fepasa; e, dias antes do leilão da Light, as tarifas de energia elétrica aumentaram em 58% para o consumidor.
As práticas neoliberais proposta pelo Consenso de Washington geraram aumento da miséria, da carestia, altas taxas de desemprego e perda de direitos por parte dos trabalhadores nos países da América Latina. As privatizações das empresas estatais aumentaram o endividamento desses países e contribuíram para a pauperização da população que teve de arcar com maiores taxas cobradas sobre os serviços. No Brasil, a implementação da cartilha neoliberal se perpetuou e os processos de privatizações e concessões a empresas privadas continuaram nos governos presidenciais de Lula, Dilma e Temer. Atualmente, o governo de Jair Bolsonaro pretende dar ênfase à política de desestatização, vendendo para o setor privado dezessete empresas estatais, dentre as quais estão os Correios, a Eletrobrás e a Casa da Moeda.
Referências:
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VENTURA, Manoel & OLIVEIRA, Mariana. “Governo anunciou 17 privatizações. Veja a lista.” Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/governo-anunciou-17-privatizacoes-veja-lista-23892489. Acessado em 31 de janeiro de 2020 às 11h e 43m.
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/historia/privatizacoes-do-governo-fernando-henrique-cardoso/