No século 16, na Europa central, foi iniciado um movimento de renovação da Igreja cristã denominado Reforma Protestante. Já no final da Idade Média vários fatores contribuíram para que isso ocorresse: a formação dos Estados Nacionais ou as modernas nações europeias, com toda a descentralização política e com príncipes limitando a autoridade do Imperador e com forte tensão entre o Estado e a Igreja.
O poder do papado entrou em declínio, ocorreram confrontos com reis, divisões entre os próprios clérigos e a necessidade de reforma. Houve um Grande Cisma e até mesmo 3 papas rivais em lugares diferentes, de 1378 a 1417. O movimento Conciliar buscou solução para a crise numa tentativa fracassada de democratizar a Igreja e governa-la por meio de concílios. Os movimentos dissidentes na França acarretaram forte oposição e a Inquisição fora oficializada em 1233.
Nos séculos 14 e 15 alguns movimentos esporádicos de protestos surgiram contra os ensinos e práticas da Igreja medieval e alguns líderes foram chamados de pré-reformadores: João Wycliff (1325-1384), João Huss (~1372-1415) e Jerônimo Savonarola (1452-1498), por combaterem irregularidades e imoralidades do clero, condenar superstições, peregrinações, veneração de santos, celibato e as pretensões papais. Também outros movimentos romperam com a Igreja, os movimentos devocionais como o misticismo, a Devoção Moderna dos Irmãos da Vida Comum. Também nasceu o interesse em estudar as obras da Antiguidade pelos Renascentistas e isso levou alguns “humanistas bíblicos” ao estudo da Bíblia nas línguas originais.
Muita convulsão política, social e religiosa havia no final da idade média, revoltas dos camponeses, guerras, epidemias, o declínio do feudalismo e da liderança dos Papas e da Igreja. A população se ressentia dos abusos da Igreja e da sua falta de propósitos e corrupção.
Muita violência, baixa expectativa de vida, contrastes e desigualdades sociais e econômicas às vésperas da Reforma, havia até mesmo certa revolta com a chamada “matemática da salvação” ou religiosidade contábil que tratava pecados como débitos e as boas obras como créditos e a venda de “indulgências” para perdão das penas temporais do pecado.
Quando o dominicano Tetzel foi vender indulgências em Wittemberg, Martinho Lutero (1483-1546), se pronunciou contrário. Lutero, natural de Eisleben, ingressou no mosteiro de Erfurt e tornou-se professor na Universidade de Wittemberg. Diante das indulgências, ele afixou na porta da Igreja da cidade, em 31 de outubro de 1517, 95 Teses ou convites para o debate na comunidade acadêmica, desafiando a autoridade da Igreja. Por isso, foi acusado de heresia e chamado a Roma, em 1518, mas recusou-se a ir e manteve suas posições. Em 1519, participou de debate e afirmou que o “infalível” Papa podia errar.
Em 1520, recebeu uma “Bula papal” para retratar-se ou seria excomungado. E Lutero, estudantes e professores de Wittemberg queimaram a Bula em praça pública. Também escreveu livros e tornou-se popular e notório em toda a Europa. Em 1521, na Dieta de Worms, Lutero reafirmou suas ideias e precisou se refugiar no castelo de Wartburg sob proteção de um príncipe-eleitor. Ali Lutero traduziu a Bíblia para o alemão e a “reforma luterana” se espalhou rapidamente, com o apoio de vários principados alemães, por todo o sacro Império.
Mas, houve forte oposição católica às novidades luteranas. Em 1526, houve certa tolerância. Mas, como em 1529 acabou essa política conciliadora, os líderes luteranos fizeram um “protesto” formal de apoio a Lutero e isso deu origem ao nome histórico “protestantes”. O auxiliar de Lutero, Filipe Melanchton (1497-1560) apresentou ao Imperador a “Confissão de Augsburgo”, defendendo a doutrina luterana (21 artigos) e indicando 7 erros da Igreja Romana.
Ocorreram guerras político-religiosas entre católicos e protestantes, de 1546 a 1555, findando com o tratado de “Paz de Augsburgo”, reconhecendo a legalidade do luteranismo como religião oficial de um território cujo príncipe a adotasse como tal. O protestantismo se espalhou pela Suécia, Dinamarca, Noruega e Islândia. Foram defendidos princípios básicos que caracterizaram as convicções e práticas protestantes: os cinco “Solas”: Sola Scriptura (somente as Escrituras), solus Christo (salvação somente em Cristo), sola gratia (salvação somente pela graça divina), sola fides (salvação somente pela fé), soli Deo gloria (glória dada somente a Deus), além do sacerdócio universal dos cristãos.
Outro reformador que marcou época foi Ulrico Zwínglio (1484-1531), reformador da Suíça, no movimento chamado “segunda Reforma” que deu origem às Igrejas Reformadas na Suíça alemã e no sul da Alemanha, promovendo mudanças mais radicais que os luteranos.
Os reformadores radicais ou Anabatistas (rebatizadores) geraram o terceiro movimento reformado, também em Zurique, Suíça, sendo mais fanáticos, entusiastas e radicais. Os anabatistas defenderam a separação completa entre igreja e estado.
O grande reformador do século 16 foi João Calvino (1509-1564), francês que se refugiou em Genebra, estudou teologia e humanidades, Direito. Esteve em Genebra por duas vezes, de 1536 a 1538, e de 1541 até ao final de sua vida. A cidade se tornou o grande centro do protestantismo e preparou líderes para toda a Europa, além de abrigar muitos refugiados das guerras religiosas. O calvinismo foi o mais completo sistema teológico protestante e originou as Igrejas Reformadas (Europa continental) e presbiterianas (Ilhas britânicas).
A Reforma Protestante ocorreu na Inglaterra com a atuação de refugiados que voltaram de Genebra. Contribuíram também, o anticlericalismo dos ingleses, os ensinos luteranos desde 1520, a tradução da Bíblia para o inglês. Mas, principalmente o rei Henrique VIII (1491-1547), com seus muitos casamentos e desentendimentos com o catolicismo, até que seu sucessor Eduardo VI (1547-1553) e seus tutores implantaram a Reforma no país e cessaram as perseguições. Sintetizaram as doutrinas luteranas e calvinistas, além dos traços da liturgia católica e, no reinado de Elisabeth I, a Inglaterra tornou-se oficialmente protestante, criando a Igreja Anglicana.
Na Escócia, o protestantismo foi introduzido por John Knox, discípulo de Calvino, e criou o conceito político-religioso de “presbiterianismo”, com igrejas governadas por oficiais eleitos pela comunidade, os presbíteros, livres da tutela do Estado.
De fato, esses protestantes não queriam inovar, mas restaurar antigas verdades bíblicas que a Igreja havia esquecido ou trocado por suas tradições humanas. Valorizaram as Escrituras, a salvação pela graça divina e pela fé somente, sem as obras.
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Referências bibliográficas:
CHAUNU, Pierre. O tempo das reformas (1250-1550): a Reforma protestante. Lugar na História, v. 49-50, Edições 70, 1993.
MARTINA, Giacomo. História da Igreja: de Lutero aos nossos dias. v. 1: A era da Reforma. São Paulo: Loyola, 1997.
SILVESTRE, Armando A. Calvino: o potencial revolucionário de um pensamento. São Paulo: Vida, 2009.
______. Calvino e a resistência ao Estado. São Paulo: Mackenzie, 2003.
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/historia/reforma-protestante/