Conhecer uma língua significa ser capazes de produzir frases anteriormente ditas e compreender frases nunca ouvidas, bem como intuir novos sentidos para palavras que possuem significados próprios. O conhecimento linguístico, comum a todos os falantes, permite combinar palavras de modo a formar as frases, e nesse sentido gerar diálogo, conversas, textos informativos, textos poéticos, letras de músicas, romances, dentre outras modalidades e gêneros textuais.
O vocabulário é finito e pode ser armazenado, contudo a possibilidade de usos e aplicações em diferentes contextos é que não se pode limitar. Conforme o linguista Noam Chomsky, há uma capacidade que ele denominou de “aspecto criativo” da prática linguística. Dessa maneira, sabe-se que os sujeitos podem realizar transformações, mudanças e intervenções na língua gerando sentidos até então desconhecidos, ou pouco usados. Uma das maneiras de atribuir às palavras novos sentidos é fazendo uso das figuras de linguagem.
As figuras de palavras são recursos linguísticos usados para mudar o sentido próprio de um vocábulo. Dentro do conjunto das figuras de palavras, tem-se a catacrese. A palavra catacrese traduz-se por “abuso” ou “mau uso”. Destaca-se que para muitos estudiosos, todas as figuras de palavras são tipos de metáforas. Dessa forma, a catacrese caracteriza-se por empregar o nome de um objeto a outro, ou ainda por usar uma palavra fora de seu significado real, atribuindo-lhe um novo sentido. O abuso no que se refere à catacrese, configura-se pela extrapolação do sentido, conforme se verifica neste diálogo:
Exemplo 1: João e sua mãe, uma costureira, conversam:
- João, traga para mim aquela caixinha de costura, por favor.
- Mãe, qual o nome desse palitinho fino de ferro espetado na caixinha?
- É o alfinete, meu filho. Tenha cuidado, pegue pela cabeça do alfinete.
- “Cabeça do alfinete? (Falou João em tom bastante curioso)
- Sim, João. Esse pontinho mais largo na ponta é chamado de cabeça.
- Eu não sabia que alfinete também tinha cabeça, mãe.
Como não há um vocábulo específico para designar a extremidade mais larga do alfinete, designa-se comumente por cabeça. Assim ocorre com outros objetos aos quais, geralmente, atribui-se palavras que designam partes do corpo humano para partes de tais objetos que não possuem significante original, como, por exemplo: pé da mesa, que se refere a parte inferior, que sustenta a mesa.
Em alguns casos, o objeto possuiu um nome específico para cada parte que o compõe, entretanto não se faz uso de tais palavra. Então, os falantes costumam utilizar do recurso da catacrese para referir-se a tal parte, por exemplo, o encosto da cadeira muitas vezes é denominado de costas da cadeira.
Outros exemplos bastante conhecidos de catacrese:
Leito do rio
Rabo de pipa.
Asa da xícara
Braço do sofá
Batata da perna
Pé da montanha
Para concluir, esta figura de linguagem, como todas as outras, emprega a palavra no sentido conotativo. Ou seja, atribuindo-se um sentido figurado que extrapola o significado próprio das palavras. Assim, a catacrese é o empréstimo de um vocábulo que se aplica com determinado significado, para aplicar com outro sentido. Como se pode verificar a seguir:
A abertura inferior da calça jeans também é conhecida por boca da calça. Empresta-se o termo boca, que tem o significado de cavidade, para designar a cavidade de uma peça de roupa.
Outro tipo de aplicação da catacrese é usar um vocábulo para designar outro: Vamos enterrar estas ideias absurdas.
Enterrar: significa ‘colocar na terra’; ‘botar terra sobre’.
Neste sentido aplica-se a palavra com o significado de esquecer, apagar.
Bibliografia:
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