A Etnomatemática e seus pressupostos históricos

Por Prof. Ailton Feitosa
Categorias: Matemática
Este artigo foi útil? Considere fazer uma contribuição!

Historicamente, a palavra Etnomatemática surgiu na década de 70, com base em críticas sociais acerca do ensino tradicional da Matemática, como a análise das práticas matemáticas em seus diferentes contextos culturais. Tendo Ubiratan D’Ambrósio como precursor e idealizador aqui no Brasil. A palavra foi cunhada da junção dos termos techné, mátema e etno. E acrescenta-se que:

Tem seu comportamento alimentado pela aquisição de conhecimento, de fazer (es) e de saber(es) que lhes permitam sobreviver e transcender, através de maneiras, de modos, de técnicas, de artes (techné ou 'ticas') de explicar, de conhecer, de entender, de lidar com, de conviver com (mátema) a realidade natural e sociocultural (etno) na qual ele, homem, está inserido. (D’AMBROSIO, 2005, p. 99-120).

Nessa linha de pensamento, percebemos que a Etnomatemática não se trata de um método de ensino nem de uma nova ciência, mas de uma proposta educacional que estimula o desenvolvimento da criatividade, conduzindo a novas formas de relações interculturais. Isso se confirma neste argumento: “é um programa que visa explicar os processos de geração, organização e transmissão de conhecimentos em diversos sistemas culturais e as forças interativas que agem nos e entre os três processos”. (D’AMBRÓSIO, 2001).

Compreendemos que a Matemática vivenciada, por exemplo, pelos vendedores em situação de rua; pelo artesão; donas de casa; pelo pescador; pelo pedreiro e costureira; a geometria na cultura indígena e em outras classes sociais é completamente distinta entre si em função do contexto cultural e social na qual estão inseridas. Mas, para ampliar a compreensão da realidade e de mundo dessas pessoas é fundamental interagir todas as práticas do cotidiano. Caso não seja possível, então, a Matemática se apresenta apenas como uma forma de resolver questões de ordem prática e sem sentido para algumas classes sociais.

Nessa perspectiva, acreditamos que um dos caminhos para fundamentar essa vertente são as ações pedagógicas construídas dentro do contexto sociocultural daqueles que se pretende educar, pois os objetivos e, consequentemente, os conteúdos devem variar de acordo com a cultura, a realidade social, as necessidades, as aspirações pessoais. A razão é que a Matemática está presente na realidade de cada um, e como tal, ela deve, sobretudo:

Basear-se em propostas que valorizem o contexto sociocultural do educando, partindo de sua realidade, de indagações sobre ela, para a partir daí definir o conteúdo a ser trabalhado, bem como o procedimento que deverá considerar a matemática como uma das formas de leitura de mundo. (MONTEIRO e POMPEU JR., 2003, p. 38).

Diante do exposto, compreendemos que o estudo de atividades fora da sala de aula, proporciona uma construção por parte do educando, do conhecimento prático e não perde o caráter acadêmico ou escolar no ensino da Matemática. Isso. Leva-nos a acreditar que o ensino da Matemática numa perspectiva Etnomatemática pode estabelecer uma relação mais consistente e construtiva entre teoria e prática por contemplar experiências cotidianas a serem refletidas e analisadas, podendo até evitar o excesso de teorias estudadas na superficialidade e insucesso dos alunos porque o ensino passa a estabelecer uma relação com cotidiano.

Recorremos à consideração feita por URTON (1997) para justificar a aplicabilidade da Etnomatemática, quando diz:

Que se trata de uma vertente que busca identificar manifestações matemáticas nas culturas periféricas e tem como referências categorias própria de cada cultura, reconhecendo que é própria da espécie humana a satisfação de pulsões de sobrevivência e transcendência, absolutamente integradas, como numa relação simbiótica. (URTON, 1997).

Pois, na atual conjuntura sócio-política da sociedade, torna-se fundamental buscar novas propostas curriculares que venham acompanhar os avanços tecnológicos, bem como reafirmar a escola como o lugar do conhecimento, do convívio e da sensibilidade, condições imprescindíveis para a constituição da cidadania. Em outras palavras, queremos dizer que a adoção de novos instrumentos culturais leva a novos caminhos pedagógicos.

Por fim, acreditamos que a Matemática nasce sob determinadas condições econômicas, sociais e culturais, por isso cada cultura, ou mesmo subcultura, deve produzir sua própria Matemática específica, que resulta das necessidades específicas do grupo social.

Referências:
D'AMBRÓSIO, Ubiratan. Sociedade, cultura, matemática e seu ensino. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, p. 99-120, 2005.
___________. Etnomatemática – elo entre as tradições e a modernidade. – Belo Horizonte: Autêntica, 2001. (Coleção em Educação Matemática, 1).
MONTEIRO, Alexandrina e POMPEU JR, Geraldo. A Matemática e os Temas Transversais. São Paulo. Editora Moderna, 2001.
URTON, Gary. The Social Life of Numbers. A Quechua Ontology of Numbers and Philosophy of Arithmetic, University of Texas Press, Austin, 1997.

Este artigo foi útil? Considere fazer uma contribuição!