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Introdução
A maioria das pessoas não sabe, mas o valor que pagamos todos os meses na conta de água se refere ao trabalho de captação, tratamento e às despesas com que as concessionárias têm de arcar para que ela chegue até nossas casas ou às indústrias e agricultores. Ou seja, na verdade, não pagamos pelo consumo da água em si mas pelo serviço de fornecimento.
Essa postura, pautada na crença há muito já desmentida de que água é um recurso infinito, acaba por fazer com que as pessoas e, principalmente, as indústrias não se preocupem com a redução no consumo da água e prevenção do desperdício e da poluição já que ela é um insumo barato e os custos com tratamento e recuperação da água acabam sendo arcados por toda a sociedade. Mas uma idéia que já vem sendo aplicada em diversos países e que começa a ser aplicada no Brasil promete mudar esse quadro: é a cobrança pelo uso da água.
Países como França, que cobra pelo uso da água bruta (captação) há anos e o Japão, onde cerca de 80% da água utilizada pelas indústrias é reutilizada devido ao alto custo cobrado pela água (Fonte SuperInteressante Abril/2009), tem servido de exemplo para a implementação de uma política que visa atribuir um valor econômico a água garantindo assim, o seu uso racional e sustentável além de obter recursos para o financiamento de programas que visem à sua preservação.
Histórico
Pautada no princípio do “usuário-pagador” ou “poluidor-pagador”¹, a cobrança pelo uso da água aparece como um dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos na Lei N.º 9.433 de 8 de janeiro de 1997, cabendo à ANA (Agência Nacional de Águas) a implementação deste instrumento em conjunto com os Comitês de Bacias Hidrográficas² (Lei N.º 9.984 de 17/07/00).
Existente desde 1934 quando foi criado o “Código de Águas” no qual já constava que o uso comum da água poderia ser gratuito ou retribuído, a idéia da cobrança pelo uso dos recursos hídricos ganhou força no âmbito federal apenas com a criação da ANA em 1997 embora já fosse objeto de estudos no Estado de São Paulo desde 1991 quando foi feita a primeira simulação de cobrança na Bacia do Rio Piracicaba (Fonte DAEE SP).
Aplicação
A cobrança pelo uso da água já vem sendo aplicada ou está em fase de implantação em alguns Estados brasileiros como Paraná, Santa Catarina, Ceará, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, além de estar em vigor também em bacias de âmbito federal como a do Rio Paraíba do Sul que atravessa os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Para se ter uma idéia do potencial de arrecadação, só no Estado do Rio de Janeiro, em 2008, foram arrecadados R$4.644.872,42 com a cobrança pelo uso da água (Fonte INEA RJ).
A idéia de se cobrar pelo uso dos recursos hídricos – captação de água e lançamento de efluentes – tem como objetivo principal incentivar a economia de água e medidas que previnam a poluição (afinal, quando algo é de graça, geralmente, ninguém se preocupa em economizar), mas também, tem como objetivo, arrecadar recursos para ser investidos em programas de preservação da água (saneamento básico, recuperação de matas ciliares, etc.). Assim, para que o instrumento de cobrança funcione é necessário que se garanta a aplicação dos recursos arrecadados na bacia hidrográfica onde foram captados na forma de planos, projetos e programas de recuperação, preservação, fiscalização e gerenciamento da bacia. Por isso, é tão importante a atuação dos Comitês de Bacia Hidrográfica que são os responsáveis por definir a aplicação dos recursos além de determinar o valor a ser pago pelos usuários.
Mas quem deve pagar pelo uso da água? No final das contas, todo mundo paga. Segundo o que vem sendo praticado no Brasil, apenas os usuários sujeitos a outorga devem pagar pelo uso dos recursos hídricos. São as indústrias, agricultores, concessionárias de água e energia (hidrelétricas), hotéis, condomínios e outros. Mas, no caso das concessionárias de água fica facultada a elas a escolha de repassar ou não os custos ao consumidor final (eu e você leitor). Geralmente os pequenos produtores rurais e pessoas de baixa renda ficam isentos do pagamento. Mas nada impede que indústrias e produtores rurais repassem os custos para seus produtos.
A questão entretanto, é que do jeito que está não dá para ficar. Atualmente 35% da população mundial não têm acesso à água potável. São 1 bilhão e 200 milhões de pessoas que já sofrem com a escassez de um recurso que é desperdiçado (Fonte CETESB) principalmente nos países desenvolvidos onde uma pessoa pode chegar a consumir absurdos 600 litros de água por dia (Fonte Planeta Sustentável. Abril/2009), quando, o necessário segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), seria de apenas 40 litros por dia por pessoa.
¹ Princípio do “usuário-pagador” e do “poluidor-pagador”: princípios do direito ambiental segundo os quais o “poluidor” deve arcar com os custos da reparação dos danos causados pela poluição e o “usuário”, pelos custos da manutenção ou preservação dos bens ambientais utilizados (a água, por exemplo). Veja: Projeto Conservador das Águas.
² Comitê de Bacia Hidrográfica: colegiado instituído por lei, de papel deliberativo, constituído por representantes do Poder Público, da sociedade civil e de usuários de água que atua no âmbito do Sistema Nacional de Recursos Hídricos. O Comitê pode ser Federal ou Estadual.
Fontes:
http://www.rededasaguas.org.br/ferramentas/o_que_e.htm
http://www.ana.gov.br/GestaoRecHidricos/Cobranca/default2.asp
Palestra sobre “Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos – 15/10/08”. Acessada em: http://www.igam.mg.gov.br/cobranca/atividades
http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/ambiente/conteudo_222328.shtml
http://super.abril.com.br/ciencia/azul-terra-442098.shtml
http://www.rededasaguas.org.br/comite/comite_01.asp
http://www.daee.sp.gov.br/cgi-bin/Carrega.exe?arq=/cobranca/index.htm
http://www.inea.rj.gov.br/mais/financeiro.asp
http://planetasustentavel.abril.ig.com.br/noticia/ambiente/conteudo_272416.shtml
http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/ambiente/conteudo_239075.shtml
http://www.cetesb.sp.gov.br/Agua/rios/gesta_escassez.asp
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/meio-ambiente/cobranca-pelo-uso-da-agua/