A Medida Provisória 746/2016, que estabelece parâmetros para a reforma do ensino médio brasileiro, foi encaminhada ao Congresso pelo Governo Federal no dia 22 de setembro. O texto determinava uma série de alterações estruturais na última etapa da educação básica, como a ampliação da carga horária, a criação de itinerários formativos distribuídos entre quatro áreas de conhecimento e o fim da obrigatoriedade do ensino de algumas disciplinas, como Artes e Educação Física. Desde então, a MP têm gerado discussões acaloradas: de um lado, estão os defensores de que a reforma solucionará diversos problemas do ensino médio; do outro, estão os movimentos contrários à MP, que se opõem à diversos pontos da medida e acusam o governo de tentar aprovar a reestruturação do ensino médio através de uma "canetada", ou seja, sem participação de professores, estudantes e sociedade civil na discussão.
A primeira alteração prevista pela MP 746 é o aumento da carga horária do ensino médio de 800 para 1.400 horas, por meio da criação da Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral. Na prática, os estudantes do ensino médio passarão a ter uma carga horária escolar mínima de 7 horas diárias. De acordo com o texto da medida, a carga horária deverá ser ampliada progressivamente, “observadas as normas do respectivo sistema de ensino e de acordo com as diretrizes, os objetivos, as metas e as estratégias de implementação estabelecidos no Plano Nacional de Educação”. Até o momento, 23 estados brasileiros confirmaram que irão participar da Política de Fomento à Implantação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral. O MEC investirá R$1,5 bilhão de reais para oferecer ensino integral a 500 mil jovens até 2018. O Plano Nacional de Educação havia determinado que, até 2024, 50% dos estudantes matriculados no ensino médio deverão cumprir jornada de no mínimo 7 horas por dia.
O texto da MP também altera significativamente o modelo de ensino médio vigente no país. Se a medida for aprovada, as escolas deverão dividir a carga horária de ensino em duas partes: 50% das horas deverão ser oferecidas de acordo com a Base Nacional Comum Curricular, mas as outras 50% serão flexibilizadas. Isso significa que metade do ensino médio será comum a todos os estudantes e oferecerá uma formação geral; na outra parte, os estudantes poderão optar pelas disciplinas que querem cursar, escolhendo um “itinerário formativo” que poderá ser voltado a cinco diferentes áreas de conhecimento: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Sociais e Humanas e Formação Técnica e Profissional. Além disso, a MP também permite que os conteúdos cursados no ensino médio sejam aproveitados no ensino superior.
Metade do ensino médio será igual para todos, mas os estudantes poderão escolher quais disciplinas cursarão na segunda metade
Uma das principais polêmicas levantadas pelo texto inicial da MP foi o ponto que determinava o fim da obrigatoriedade de algumas disciplinas no ensino médio. A medida institui que o ensino de Língua Portuguesa, Língua Inglesa e de Matemática serão obrigatórios nos três anos desta etapa escolar, mas tornava as disciplinas de Artes e Educação Física facultativas no ensino médio- além disso, o texto não garantia o ensino de Filosofia e Sociologia. A repercussão negativa fez com que o governo recuasse temporariamente e publicasse, no dia 23 de setembro, o texto final da medida provisória, que mantinha a obrigatoriedade dessas disciplinas até o segundo ano letivo posterior à aprovação da nova base nacional comum curricular. O MEC manteve, no entanto, o trecho que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação tirando a garantia de que essas disciplinas serão obrigatórias no ensino médio.
Uma das principais polêmicas foi o fim da obrigatoriedade das disciplinas de Artes e Educação Física; O MEC recuou e manteve a obrigatoriedade até o segundo ano letivo posterior à aprovação da nova base nacional comum curricular
A reforma também possibilita que escolas contratem “professores sem diploma”, ou seja, profissionais de áreas diferentes das quais irão ensinar e especialistas “com notório saber”. Esses profissionais deverão ser “reconhecidos pelos respectivos sistemas de ensino” e poderão atuar apenas na formação técnica e profissional.
Escolas públicas e privadas podem escolher se irão flexibilizar o currículo e ofertar ensino em tempo integral
O Ministério da Educação afirmou que as escolas públicas e privadas do Brasil terão autonomia para decidir se cumprirão ou não duas medidas indicadas pela MP: a oferta do tempo integral e a flexibilização do currículo.
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Entenda os dois lados da polêmica sobre a MP 746/2016
No dia 8 de setembro, o Ministério da Educação divulgou os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2015, que indicaram que o ensino médio foi a etapa escolar brasileira com pior desempenho no levantamento. O ministro da Educação, Mendonça Filho, afirmou no mesmo dia que a reforma do ensino médio se tornaria uma prioridade para o Governo e pediu urgência na tramitação do projeto de lei 6840/2013, que já propunha a reestruturação da última etapa da educação básica e estava em discussão na Câmara dos Deputados.
Duas semanas depois, o presidente Michel Temer anunciou a Medida Provisória. Imediatamente, grupos de estudantes secundaristas começaram a protestar contra a medida, ocupando as escolas em que estudavam e impedindo que as aulas continuassem acontecendo. O movimento tomou grandes proporções - no dia 28 de outubro, 1.197 escolas estavam ocupadas. Os protestos resultaram no adiamento do Enem 2016 para mais de 200 mil candidatos.
Após a publicação da Medida Provisória, estudantes secundaristas ocuparam escolas e impediram que as aulas continuassem acontecendo para protestar contra a reforma e contra a PEC 241
No seu site oficial, a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES) listou 5 motivos pelos quais ela se posicionava contra a reforma do ensino médio. Segundo a organização, a flexibilização da grade curricular, manifestada através da exclusão das disciplinas de Artes, Educação Física, Filosofia e Sociologia, desvalorizaria o pensamento crítico e resultaria em uma formação tecnicista e mecânica; além disso, a organização afirma que houve falta de diálogo na elaboração da proposta, que teria sido “colocada de forma autoritária, imposta à juventude e à sociedade sem nenhum tipo de debate” e não atenderia às necessidades das escolas brasileiras. A UBES ainda argumenta que o aumento de horas não garantirá a qualidade do ensino ofertado e que a MP contradiz o Plano Nacional de Educação. Por último, a instituição afirma que a MP reflete a “confusão” e o “despreparo” do governo, que anunciou uma medida que “não traz propostas claras” e que vem ao mesmo tempo em que “o governo busca cortar gastos através da PEC 241 e do PLP 257”. Além da UBES, outras organizações se colocaram contrárias às propostas, como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e sindicatos de professores. O Grupo de Trabalho Educação, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal, lançou uma nota pública repudiando o fato da reforma do ensino médio ter sido definida através de uma Medida Provisória.
UBES acusa o governo de promover uma reforma autoritariamente, sem diálogo com estudantes e professores
Por outro lado, o Ministério da Educação defende que reforma é necessária porque a crise do ensino médio prova a falência do modelo atual de ensino. Na abertura do encontro internacional Educação 360, no Rio de Janeiro, a secretária executiva do MEC, Maria Helena Guimarães de Castro, afirmou que a reestruturação aconteceu através de Medida Provisória devido à urgência do problema do ensino médio no país, que vem sendo debatido desde o final da década de 1990 e ainda não atingiu um consenso. O Ministério garantiu, ainda, que as disciplinas de Artes, Educação Física, Sociologia e Filosofia não serão retiradas do currículo, mas deverão obedecer aos parâmetros definidos pela Base Nacional Comum Curricular. A flexibilização do currículo seria uma forma de reaproximar os jovens do ensino médio e diminuir as altas taxas de evasão escolar. Nessa semana, o MEC promoveu o seminário Evidências Internacionais para a Reforma do Ensino Médio no Brasil, que reuniu especialistas em educação do Brasil e do exterior para discutir as mudanças no currículo brasileiro. No evento, foram apresentados exemplos de nações como Suíça, Polônia e México, que possuem cases de sucesso em mudanças similares às que estão acontecendo no Brasil. O MEC também listou, nesta página, uma série de artigos de opinião a favor da reforma, que destacam principalmente a urgência em relação à crise do ensino médio e comparam as mudanças com experiências internacionais de sucesso.
MEC afirma que a reforma era urgente e irá combater evasão escolar e baixo desempenho de estudantes do ensino médio
Futuro
Para ser convertida em lei, a MP 746 precisaria ser aprovada em até 120 dias pela Câmara e pelo Senado ou perderia o efeito. No dia 16 de novembro, o prazo de vigência da medida provisória foi prorrogado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros. Agora, deputados e senadores terão mais 60 dias para analisá-la.
Se a MP for aprovada, as mudanças não serão implementadas integralmente em 2017: o novo ensino médio será obrigatório após um ano da publicação da Base Nacional Comum Curricular, que deve acontecer em meados do ano que vem. No entanto, a partir da aprovação da MP, os estados já poderão iniciar a implantação da reforma.
Dê sua opinião
Agora que você já está informado sobre a MP 746/2016, que propõe a reforma do ensino médio, que tal dar a sua opinião? A Câmara abriu consulta pública sobre a proposta e receberá respostas até o dia 25 de novembro. Para participar do debate, clique aqui. A consulta pública do Senado também está aberta e pode ser acessada neste link.
Se você ainda ficou com alguma dúvida e quer solucioná-la antes de dar sua opinião, acesse o tira-dúvidas sobre a reforma do Ensino Médio criado pelo MEC. Ele está disponível no portal do Ministério.