A interpretação de dados levantados surge como um desafio para a educação atual. Uma vez que há uma vasta gama de informações disponíveis e de fácil acesso, a sua compreensão efetiva permanece como fator limitante para sua melhor utilização. No que tange ao ensino da matemática, percebe-se uma nítida distância entre a efetiva resolução de um cálculo com a compreensão significativa de onde este cálculo partiu ou de que contribuição poderá trazer a quem o está resolvendo. “Embora a resolução de problemas envolvendo as quatro operações aritméticas e os conceitos algébricos venham sendo objetos de investigações há décadas, evidenciam-se, nos dados apontados pelos sistemas nacionais e internacionais de avaliação oficial, a persistência do baixo desempenho dos estudantes nesse tipo de tarefa.” (SAEB, 2003; PISA, 2003)
Uma grande parcela dos assuntos trabalhados nas disciplinas consideradas exatas, como as ciências naturais e a matemática, ainda distancia-se do mundo real dos estudantes, e não adquirem aspectos significativos mesmo quando esses estudantes são capazes de satisfatoriamente resolvê-los. No momento em que se busca verificar os aspectos referentes ao seu grau de compreensão referente aos propósitos das questões que trabalham, verifica-se novamente uma nítida separação entre a frieza da resolução mecanizada de um problema com o entendimento de seu propósito. Esse problema se agrava quando se chega às últimas séries do Ensino Fundamental. “Os dados das avaliações oficiais apontam para a existência de um grande gargalo entre o quinto e o sétimo ano do Ensino Fundamental e sua relação estreita com as dificuldades dos estudantes frente às tarefas relacionadas ao número racional e à divisão.” (FÁVERO, NEVES, 2009)
Entretanto, a inexistência de uma efetiva compreensão dos fundamentos envolvidos na resolução de um problema dificulta uma interpretação no momento em que propositadamente se mascara aquilo que se deseja do aluno, uma vez que este passa a ter dificuldades em compreender o problema como um todo. Há relatos de casos em que determinado problema exigia do educando a utilização de uma ferramenta amplamente por ele dominada, mas não foi acertadamente resolvido porque esse educando não foi capaz de interpretar a questão devidamente a ponto de conhecer seu método de resolução melhor indicado. Dessa forma, “Trabalhar com a interpretação é de grande importância para qualquer que seja o conteúdo”. (FÁVERO, NEVES, 2009)
Particularmente ao nos referirmos ao ensino da matemática, e ainda mais pontualmente ao estudo da divisão, observa-se ser este assunto de grande dificuldade quando o aluno inicia a resolução de problemas numéricos sem devidamente compreender o sentido da divisão. “Os estudos sobre a divisão apontam um melhor desempenho dos alunos em situação de divisão partitiva com quantidades contínuas e que a noção de divisão precede o uso de procedimentos matemáticos formais.” (FÁVERO, NEVES, 2009) Dessa forma, objetos concretos podem servir como excelentes ferramentas quando se deseja introduzir o assunto.
Estudos tem demonstrado que uma grande parcela dos erros cometidos pelos estudantes nas disciplinas de ciências naturais e na matemática devem-se a sua dificuldade de compreensão do que está exposto, e não propriamente aos procedimentos envolvidos nos cálculos.
No que tange ao ensino da matemática, a grande maioria dos assuntos permite que se utilize de um procedimento pedagógico firmado excessivamente na prática mecânica da resolução de exercícios, na busca de uma aprendizagem pautada na repetição. Segundo Fávero e Soares (2002), “vários estudos têm relatado a permanência de uma prática docente ainda pautada em memorização de regras e procedimentos em detrimento do desenvolvimento de competências conceituais”, o que dificulta uma compreensão significativa e limita o aluno a um processo de resolução de exercícios mesmo quanto este não efetivamente compreende a sua razão. Ocorre então o desenvolvimento de uma compreensão limitada das quatro operações e do sistema numérico como um todo, uma vez que estes surgem apenas como um conjunto de regras estabelecidas e inquestionáveis.
Pesquisas focando a análise de erros dos educandos mostram que muitas vezes os professores limitam-se a descrever o erro sem propor hipóteses explicativas para sua ocorrência. Muitas vezes não há uma reflexão sobre a origem conceitual deste erro. Entretanto, uma análise mais aprofundada de um erro pode permitir que se estabeleça diretrizes capazes de apontar o processo metodológico como seu fator desencadeante. Entre conjecturas, pode-se apontar que talvez “o aluno simplesmente não tenha resolvido com atenção por ser uma questão solta, descontextualizada ou ele não associou que devemos encontrar quantas vezes o divisor está no dividendo, ou o erro ocorreu por falta de atenção do aluno, falta de segurança do aluno, falta de conhecimento da tabuada, etc.” (FÁVERO, NEVES, 2009)
Entretanto, pesquisas dessa natureza na maioria das vezes apontam novamente para a interpretação incorreta daquilo que está sendo pedido. Por exemplo, o aluno pode saber armar uma operação corretamente, mas no momento em que ele necessita retirar os dados corretamente de um problema proposto, apresenta dificuldades e muitas vezes acaba o fazendo de modo equivocado. Dessa forma, reinterando o exposto, a interpretação surge como uma ferramenta essencial à compreensão de qualquer assunto, no momento em que se deseja ir além de uma resolução mecanizada do exercício. E, como fatores extremante relevantes a serem considerados no momento em que se deseja proporcionar essa ferramenta ao educando, estão a percepção das possibilidades de associação deste assunto ao seu cotidiano e a postura do professor como um agente orientador de aprendizagem, e não simplesmente como um transmissor de informações.
Referências:
FÁVERO, Maria Helena; NEVES, Regina da Silva Pina, Competências para resolver problemas e para analisar a resolução de problemas, Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE) * Volume 13, Número 1, Janeiro/Junho de 2009 * 113-124.
SAEB. (2003). Relatório/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. Brasília: O Instituto.
PISA. (2003). Estrutura de Avaliação: conhecimentos e habilidades em matemática, leitura, ciências e resolução de problemas. São Paulo: Editora Moderna.
FÁVERO, M. H., & SOARES, M. T. C. (2002). Iniciação escolar e a notação numérica: Uma questão para o estudo do desenvolvimento adulto. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 18(1), 43-50.