A gramática descritiva é o estudo dos mecanismos referentes ao funcionamento de uma língua em um contexto, observando-se o tempo e a interação entre os falantes. Dessa maneira, a gramática analisa e descreve, de acordo com a definição de uso padrão e culto, as normas de funcionamento, a estrutura e a configuração formal que caracterizam uma língua.
Dentro deste estudo, a morfologia é considerada como a primeira articulação da gramática, na qual o vocábulo formal é o objeto de análise.
Com isso, a morfologia é a primeira articulação gramatical que estuda os segmentos fônicos associados a uma significação léxica (ou seja; a palavra) e suas formas. Assim, a morfologia sistematiza em classes as unidades mínimas dotadas de sentido de acordo com características e funções comuns entre elas.
As classes gramaticais descritas são:
O primeiro critério de classificação está relacionado as variações que a palavra pode apresentar. Logo, as classes estão separadas em palavras variáveis e invariáveis.
Palavras variáveis podem mudar de acordo com os seguintes critérios; gênero e número (algumas em grau); e são elas:
- Verbo
- Substantivo
- Adjetivo
- Pronome
- Artigo
As palavras invariáveis não apresentam modificações de acordo com o gênero ou com o número, elas se mantêm sob o mesmo formato, independentes do contexto a que estão inseridas, ou às palavras as quais se ligam no arranjo textual. São elas:
- Advérbio
- Preposição
- Conjunção
Numerais: constituem uma classe de palavras com a peculiaridade de subclassificações variáveis e invariáveis.
Observe os exemplos:
A | militante | filósofa | ficou | muito | indignada |
Artigo feminino singular | Substantivo sem marca de gênero singular | Adjetivo feminino singular | Verbo feminino singular | Advérbio invariável | Feminino singular |
Todas as palavras nesta frase concordam em gênero e número, por isso foram registradas no feminino e no singular. Com exceção do advérbio, que por pertencer a uma classe invariável, não compromete o sentido ou a concordância dos vocábulos na frase.
Os verbos apresentam outras variações específicas: tempo, pessoa, modo e voz.
Os filósofos militantes caminhavam rapidamente com bandeiras partidárias.
De acordo com a análise realizada no exemplo anterior, tem-se uma estrutura concordando com o gênero masculino e o número no plural.
Palavras de classes invariáveis:
- rapidamente: advérbio
- com: preposição
No exemplo anterior “militantes” é substantivo, enquanto neste exemplo “militantes” apresenta-se como adjetivo. A mesma inversão ocorre com a palavra filósofo.
No estudo da língua portuguesa, toda análise se refere às combinações de formas; assim, cada classe possui uma nomenclatura e é analisada de acordo com a função que exerce dentro de determinado contexto, na relação com as outras palavras. O que se trata de um outro plano gramatical; sintaxe.
Morfologia: aprofundando o conhecimento gramatical
De acordo com Joaquim Matoso Camara Júnior no livro “Estrutura da Língua Portuguesa” o segmento fônico se associa a uma significação gramatical situando-se na primeira articulação da língua (a morfológica), gerando o vocábulo formal. O que se denomina de vocábulo é a palavra ou ainda a unidade mórfica por si só. Ao estudar morfologia, analisa-se, então, os morfemas. Os morfemas constituem-se por serem unidades de som e conteúdos menores do que a palavra. São unidades significativas mínimas, porque possuem significado, mas nem sempre funcionam de forma independente, precisam estar conectadas a outras. Exemplo: o “s” que marca o plural é uma unidade com significado de número, mas não faz sentido livremente. O vocábulo carro/s/ pode gerar outros, como carroça, carruagem, carreta. Enquanto o morfema /s/ que marca o plural na palavra só funciona ligado a outros morfemas com sentido completo.
Assim, a gramática identifica dois tipos de morfemas:
- Morfemas lexicais: são as formas livres: carro.
- Morfemas gramaticais: possuem algum significado mas só existem presos /s/ (como marca de plural) /in/ (infeliz); dentre outros.
Formas livres constituem uma sequência funcionando isoladamente.
Exemplo: As flores nasceram hoje pela manhã.
Formas presas funcionam ligadas a outras.
Exemplo: “pro” – do vocábulo “proscrever”
Desta maneira, o vocábulo formal caracteriza-se por:
- Uma unidade final indivisível em duas ou mais formas livres. Exemplo: paz.
- Duas ou mais formas presas. Exemplo im + pro +vá + vel
- Uma forma livre e uma ou mais formas presas. Exemplo: in + feliz
OBSERVAÇÃO: Esses mesmos critérios aplicam-se às partículas proclíticas enclíticas, introduzindo um terceiro conceito na língua portuguesa; o de forma dependente.
O critério mórfico estabelece a separação dos vocábulos por espaços em branco, registrando na ortografia as formas independentes. As palavras constituem-se por unidades menores (morfemas), ao passo que a frase se compõe por palavras, e estas são graficamente separadas. Leia o período e observe esta descrição em funcionamento no texto:
A primeira vez que viajamos juntos meus pais ainda eram felizes. Todos muito esperançosos e cheios de planos de um retorno que prometia ser a reconstituição de fragmentos de vidas. A viagem era de carro, o percurso foi previamente mapeado. Compartilhávamos uma profunda sensação de felicidade. Era como uma segunda via de identidade, com direito a uma reparação histórica. Nossa família refazia-se no caminho por um emaranhado de contos. Agradava-me ouvir vovó. Suas memórias misturavam-se à memória coletiva de um povo. E nesse processo vovó já nem mais sabia separar a realidade dela da de seus antepassados.
(Leticia Gomes Montenegro; Ensaios de Contos I. Textos não publicados; 2018)
A análise morfológica identifica a classe de cada palavra e verifica suas combinações dentro do texto. Algumas classes podem ocupar o papel de outra em determinada construção frasal. Por exemplo, a classe dos nomes (os substantivos e os adjetivos) podem se intercambiar.
No termo destacado o substantivo “memória” é caracterizado pelo adjetivo “coletiva”.
Observe como o adjetivo torna-se substantivo neste exemplo: “A coletiva (substantivo) em torno dos familiares trazia-os as tristes memórias.”
Bibliografia:
CAMARA JR, Joaquim Mattoso. Estrutura da Língua Portuguesa. – 8. ed., – Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1977
CASTILHO, Ataliba T. de. Nova gramática do português brasileiro. – 1. Ed., 4ª reimpressão – São Paulo: Contexto, 2016
CUNHA, Celso e CINTRA, Luís F. Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. – 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.