Pretérito mais-que-perfeito do indicativo

Por Cynthia Cordeiro Chalegre

Graduada em Letras-Português (USP, 2011)

Categorias: Português
Ouça este artigo:
Este artigo foi útil? Considere fazer uma contribuição!

No pretérito, os fatos expressos pelos verbos apresentam ocorrência anterior ao momento da enunciação. Ou seja, em orações em que há ações expressas no pretérito, temos referência a algo que aconteceu antes do momento da fala. Com relação ao pretérito mais-que-perfeito, seu emprego indica, principalmente, uma ação anterior a outra já passada, mas admite outros contextos de utilização, como veremos adiante.

Há duas formas de representá-lo: simples ou composto. Em sua forma simples, o pretérito mais-que-perfeito do indicativo é expresso pelas desinências –ra, -ras, -ra, -ramos, -reis, -ram (falara, beberas, partira, faláramos, bebêramos, partíramos etc.). Já em sua forma composta, é indicado pelo verbo auxiliar ter acrescido do particípio do verbo principal (tinha falado, tinha bebido, tinha partido etc.).

Vejamos alguns exemplos de usos do pretérito mais-que-perfeito em suas duas formas:

Forma simples (desinência –ra)

O mar tornara-se tão revolto que o menino se afogou.
(o mar tornou-se revolto antes de o menino se afogar)

Quando olhei para trás, o fogo consumira boa parte da vegetação do terreno.
(O fogo consumiu a vegetação antes de eu olhar para trás)

Bebera a garrafa inteira; caiu quase morto na calçada.
(Bebeu a garrafa inteira antes de cair na calçada)

Forma composta (verbo auxiliar ter + particípio do verbo principal)

Chegou a época das chuvas e o inverno rigoroso já tinha tornado os dias mais escuros.
(O inverno tornou-se rigoroso antes da chegada da época das chuvas)

Quando conquistou a fortuna, já tinha bebido do vinho amargo da vergonha.
(Bebeu do vinho amargo da vergonha antes de conquistar a fortuna)

A viúva tinha consumido boa parte dos bens no vício do jogo, quando perdeu o filho mais novo.
(Consumiu boa parte dos bens antes de perder o filho mais novo)

Cancelaste as passagens quando já tínhamos pagado o hotel.
(O hotel foi pago antes do cancelamento das passagens)

A forma composta do pretérito mais-que-perfeito, em geral, é a preferencialmente utilizada.

O pretérito mais-que-perfeito pode apresentar outras possibilidades de uso, conforme veremos nos exemplos a seguir:

a) Fato vagamente situado no passado – não tão precisamente expresso:

Fizera fortuna, comprara o carro do ano, casara e tivera filhos, mas nada nele mudara por dentro.

b) Pode ser usado para atenuar um pedido, expressando um fato passado com relação ao presente:

Ele tinha vindo para convencê-lo de que quer ajudá-lo. Não seja orgulhoso!

c) Pode aparecer em substituição ao futuro do pretérito, sobretudo em linguagem literária:

“Um pouco mais de sol – e fora (=teria sido) brasa” (Mario de Sá-Carneiro)

d) Também em linguagem literária, pode ocorrer em substituição ao pretérito imperfeito do subjuntivo:

Sê propícia para mim, socorre
Quem te adora, se adorar pudera (=pudesse)!
(Alphonsus de Guimaraens)

e) O emprego do pretérito mais-que-perfeito também ocorre em frases exclamativas:

Quisera eu ter a vida que tens!

Tomara que chova no verão!

A conjugação dos verbos regulares no pretérito mais-que-perfeito segue os seguintes paradigmas:

Forma simples

Verbo andar (-ar, 1ª conjugação)
1ª pessoa – singular Eu andara
2ª pessoa – singular Tu andaras
3ª pessoa – singular Ele/ela andara
1ª pessoa – plural Nós andáramos
2ª pessoa – plural Vós andáreis
3ª pessoa – plural Eles/elas andaram

 

Verbo receber (-er, 2ª conjugação)
1ª pessoa – singular Eu recebera
2ª pessoa – singular Tu receberas
3ª pessoa – singular Ele/ela recebera
1ª pessoa – plural Nós recebêramos
2ª pessoa – plural Vós recebêreis
3ª pessoa – plural Eles/elas receberam

 

Verbo surgir (-ir, 3ª conjugação)
1ª pessoa – singular Eu surgira
2ª pessoa – singular Tu surgiras
3ª pessoa – singular Ele/ela surgiras
1ª pessoa – plural Nós surgíramos
2ª pessoa – plural Vós surgíreis
3ª pessoa – plural Eles/elas surgiram

 

Forma composta

 

Verbo andar (-ar, 1ª conjugação)
1ª pessoa – singular Eu tinha andado
2ª pessoa – singular Tu tinhas andado
3ª pessoa – singular Ele/ela tinha andado
1ª pessoa – plural Nós tínhamos andado
2ª pessoa – plural Vós tínheis andado
3ª pessoa – plural Eles/elas tinham andado

 

Verbos receber e fugir
(-er / -ir, 2ª e 3ª conjugações), respectivamente
1ª pessoa – singular Eu tinha recebido / fugido
2ª pessoa – singular Tu tinhas recebido / fugido
3ª pessoa – singular Ele/ela tinha recebido / fugido
1ª pessoa – plural Nós tínhamos recebido / fugido
2ª pessoa – plural Vós tínheis recebido / fugido
3ª pessoa – plural Eles/elas tinham recebido / fugido

Bibliografia:

CUNHA, C.; CINTRA, L. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2013. 800 p.

CEGALLA, D. P. Novíssima Gramática da Língua Portuguesa. 48ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 2009. 696 p.

Este artigo foi útil? Considere fazer uma contribuição!