Por Ana Lucia Santana
Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço, nasceu no dia 26 de julho de 1875, na cidade de Kresswil, na Basileia. Sua família era muito religiosa, o pai e outros parentes eram pastores da Igreja Luterana, o que justifica o interesse precoce de Jung pela filosofia e pelo espiritualismo. Alguns trabalhos seus, posteriormente, desenvolveram a questão da religião e sua contribuição para o amadurecimento psicológico dos indivíduos, bem como dos povos e civilizações. Apesar de crescer em um lar pautado por preceitos espirituais, Jung sofreu com momentos de desordem familiar, além de enfrentar uma certa solidão e a inveja dos colegas.
Assim, muitos dos temas desenvolvidos por Jung brotaram de suas próprias experiências pessoais. Isso fica claro em sua autobiografia, “Memórias, Sonhos e Reflexões”, publicada em 1961. O psiquiatra suíço vivenciou constantemente sonhos marcantes e a visão de imagens mitológicas e espirituais, passando então a nutrir um grande interesse por mitos, sonhos e religiões, do ponto de vista psicológico. Ele também experimentou a ocorrência de manifestações parapsicológicas, o que suscitava em sua inteligência questionamentos cada vez mais freqüentes. Jung se dividia entre a persona social, que se expressava no meio familiar e na sua performance pública, e um mundo interior repleto de religiosidade e fenômenos espirituais. Talvez por esse motivo tenha se dedicado em suas pesquisas e em sua obra a compreender como se dá a conexão entre esses dois universos, para que a pessoa se sinta completa. Esses aspectos de sua personalidade foram provavelmente legados pela figura materna.
Já o pai lega a Jung uma fé cega, que despreza o conhecimento. Cabe a seu filho resgatar a atitude cognitiva para dar à sua fé um formato transformado, olhar para os textos sagrados não como palavras cristalizadas, mas como base de entendimento das suas experiências transcendentais. Ele se revelava perplexo e inquieto diante da falta de contato entre Ciência e Religião. Foi justamente essa insatisfação e a tentativa de encontrar esse elo de conexão para devolver ao homem sua integridade, que o levou a optar pela Psiquiatria. Para ele, essa esfera do conhecimento humano era a única instância que propiciava esse encontro entre ambas.
Sua tese de graduação – “Psicologia e Patologia dos Assim Chamados Fenômenos Psíquicos” - foi igualmente fruto de suas preocupações espirituais, envolvendo a análise psicológica de mensagens pretensamente recebidas por uma prima considerada médium. Jung foi interno na Clínica Psiquiátrica Bugholzli, em Zurique. Neste local estudou com Pierre Janet, em 1902, e desenvolveu seu famoso teste de associação de palavras – base dos detectores de mentiras -, método que utilizava para diagnosticar seus pacientes. O sucesso com estas pesquisas rendeu-lhe a oportunidade de tomar posse como professor na cadeira de Psiquiatria na Universidade de Zurique, com apenas trinta anos de idade. As influências de Jung na juventude, na literatura e na filosofia, foram Pitágoras, Heráclito, Platão, Kant, Goethe, Schopenhauer, entre outros. Mas foi a obra de Freud que impulsionou Jung na direção do conhecimento pioneiro da mente. Logo que entrou em contato com os trabalhos do criador da Psicanálise, enviou suas próprias pesquisas sobre o inconsciente para análise do mestre, reafirmando alguns de seus conceitos.
A partir desse momento os dois desbravadores passaram a se corresponder – um total de 359 cartas, depois publicadas entre 1906 e 1913. No primeiro contato pessoal entre ambos, desenrolou-se uma conversa de aproximadamente 13 horas, sem nenhum intervalo. Nasceu aí uma amizade de pelo menos sete anos, embora suas pesquisas apresentassem também diferenças importantes. Jung, por exemplo, não aceitava as explicações de natureza sexual para todos os distúrbios emocionais, enquanto Freud não conseguia digerir as inquietações espirituais do suíço. À medida que essas distinções entre ambos foram se intensificando, a ruptura entre eles se tornou inevitável, e não deixou de ser dolorosa e impregnada de mágoas. Essa ruptura persiste com integrantes de uma e de outra escola em lados opostos até hoje.
Antes mesmo de seu contato com Freud, Jung já desenvolvia a ‘Psicologia dos Complexos’, que posteriormente ele chamaria de ‘Psicologia Analítica’. Foi dele que o alemão herdou o conceito de complexo. Esta linha psicológica nasce de sua interação com os pacientes. Sua idéia de inconsciente também já estava bem consolidada antes de conhecer Freud, mas com ele certamente pôde amadurecer suas pesquisas. Com estas concepções, somadas aos estudos sobre os sonhos e sobre desenhos, o suíço mergulhou na percepção dos meios de expressão do inconsciente, no qual estão realmente reprimidos conteúdos pessoais, e é então que ele desenvolve a noção de inconsciente coletivo, no qual estão impressos os arquétipos, símbolos que envolvem imagens e sentimentos de natureza universal. Quanto aos fenômenos psíquicos, que a Ciência ainda não consegue explicar, Jung usa o conceito de sincronicidade para tentar racionalizá-los – ele explica fatos que vão além da compreensão racional tradicional -, inspirado pela Alquimia.
Carl Gustav Jung morreu em sua casa, à beira do lago de Zurique, em Küsnacht, no dia 06 de junho de 1961, aos 86 anos.