Ações afirmativas são medidas que tem por objetivo reverter a histórica situação de desigualdade e discriminação a que estão submetidos indivíduos de grupos específicos. Elas partem do reconhecimento de que alguns grupos sociais – tais como os negros, os indígenas e as mulheres – foram historicamente privados de seus direitos, resultando em uma condição de desigualdade (social, econômica, política ou cultural) acumulada que tende a se perpetuar. São ações públicas ou privadas que procuram reparar os aspectos que dificultam o acesso dessas pessoas as mais diferentes oportunidades. As ações afirmativas podem ser adotadas tanto de forma espontânea, quanto de forma compulsória – isso é, através da elaboração de medidas que as tornam obrigatórias. O fim dessas medidas é sanar uma situação de desigualdade considerada prejudicial para o desenvolvimento da sociedade como um todo.
No Brasil, muitas pessoas ligam esse tema unicamente a política de adoção de cotas raciais nas universidades. Entretanto, podemos citar outros exemplos de ações afirmativas. A criação de delegacias especializadas para o atendimento de mulheres é uma delas. Essa medida parte do reconhecimento de que as mulheres sofrem historicamente de um tipo especial de violência que resulta da sua situação estrutural de desigualdade. A criação das delegacias da mulher não resolve o problema da violência, mas o sana na medida em que parte da consciência de que é preciso uma abordagem específica para esses casos. Em empresas privadas, a reserva de uma parcela dos postos de trabalho para pessoas com deficiências físicas ou intelectuais também não é uma medida que resolve definitivamente a condição de desigualdade desse grupo. Entretanto, ela reconhece a existência do problema e colabora para a inclusão ativa dessas pessoas. Leis que exigem uma quantidade mínima de mulheres na candidatura de cargos públicos, cursinhos voltados unicamente para a população de baixa renda e a distribuição de terras e habitação para grupos vulneráveis também são exemplos de ações afirmativas já adotadas há décadas em alguns países.
O interessante dessas ações é que elas partem da necessidade de dar a noção de justiça social uma nova interpretação. Segundo uma abordagem universalista e baseada no princípio da meritocracia, ser justo é tratar todos de forma igual. No entanto, em uma sociedade permeada por uma série de desigualdades, resultantes de um processo histórico específico, a adoção desse princípio acaba apenas reproduzindo as desigualdades já existentes. As ações afirmativas partem da ideia de que é preciso reconhecer a existência das desigualdade para que se chegue na igualdade – e não atuar como se tal igualdade já existisse. O seu objetivo é sanar situações de desigualdade que são consideradas socialmente desfavoráveis, tanto para o indivíduo, quanto para o conjunto de população.
No início da década de 2000, algumas universidades públicas passaram a adotar as cotas raciais no vestibular, reservando uma parte das vagas para candidatos negros, pardos e indígenas. Além de colaborar para a eliminação de elementos persistentes das descriminações que se forjaram no passado e se recriam no presente, seu objetivo é também favorecer um ambiente acadêmico mais diverso. O maior envolvimento de negros e indígenas no campo das Ciências Sociais, por exemplo, irá colaborar para a emergência de novas formas de pensar e teorizar o país. Ainda que algumas pesquisas recentes já apontem para os impactos positivos da adoção das cotas – indicando um desempenho excepcional dos alunos cotistas –, seus resultados mais profundos serão sentidos em algumas décadas, com a maior inserção desses grupos em categorias profissionais onde os brancos são maioria absoluta. De caráter temporário, as cotas, como ações afirmativas que são, visam acelerar transformações para intervir num cenário marcado por uma desigualdade racial extrema.
Bibliografia:
GEMAA, Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa. Ações afirmativas. Ibase, 2011. Disponível em: http://gemaa.iesp.uerj.br/dados/o-que-sao-acoes-afirmativas.html
IBASE, Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas. Cotas raciais: por que sim? Rio de Janeiro, Ibase, 2008. Disponível em http://www.ibase.br/userimages/ibase_cotas_raciais_2.pdf
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/sociologia/acoes-afirmativas/